Por Pedro Augusto Pinho

“Positivamente, a Revolução Constitucionalista de São Paulo não era nenhuma dessas três coisas. Não era uma revolução, era uma represália. Não era constitucionalista, pois apenas contribuiu para perturbar a constitucionalização do país. E, por estranho que pareça, também não era paulista. “Era feita dos grãos de ódio de todos os reacionários, de todos os tempos e de todos os Estados” (Alzira Vargas do Amaral Peixoto, Getúlio Vargas, meu Pai, Editora Globo, Porto Alegre, junho de 1960).

“Nosso país, até a Revolução de 1930, era constituído por uma economia mercantil-agrária-exportadora e, naturalmente, livre cambista. Já possuíamos uma indústria leve, embora criada, induzida e subordinada pelo setor exportador, como nos ensinou Furtado. Não contávamos, até então, com um efetivo processo de industrialização”.

“Liderada por Vargas, a Revolução de 1930 foi amplamente vitoriosa. Construímos um novo Estado, necessariamente interventor e desenvolvimentista. Criamos um incipiente sistema de Planejamento e Administração Pública e formamos um novo quadro técnico de funcionários públicos. Retomamos o caráter público do Banco do Brasil, dirigindo o crédito público para os novos objetivos da nação. A Política Econômica passou a ser efetivamente administrada para a industrialização”.

“Recuperamos o crescimento já em 1933 e atravessamos a tempestade da Grande Depressão e da Segunda Grande Guerra, avançando na industrialização. Com ela, cresceu a urbanização e a classe trabalhadora, para a qual o Estado criou uma legislação protetora” (Wilson Cano, Brasil – construção e desconstrução do desenvolvimento, Economia e Sociedade, vol.26, nº 2, Campinas, Agosto de 2017).

A Tabela a seguir, construída com dados de IBGE, artigos diversos e no gráfico da Folha de S. Paulo, 04/07/2020, artigo de Thais Carrança, (País vive 1ª onda de fechamento de fábricas em meio à pandemia), demonstra as oscilações da participação industrial de transformação no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.

ANO     PARTICIPAÇÃO INDUSTRIAL NO PIB (%)

1929                          12,5

1947                          16,5

1961                          22,5

1967                          20,4

1974                          26,0

1986                          27,3

1999                          14,5

2005                          17,4

2019                          11,0

O que nos ensina esta tabela? Que o Governo Vargas assume a direção de um país agrícola. Como escreveu Silvio Peixoto: “era um crime constranger o Brasil à camisa de força da monocultura” (Aspectos Históricos do Estado Novo, D.I.P., Gráfica Olímpica, RJ, s/data).

E após o Estado Novo, Vargas já apresentava o êxito na industrialização (16,5%, em 1947) e deixa com sua morte um novo padrão de desenvolvimento nacional que só será interrompido com o Golpe de 1964. Observar o ápice de 1961 e a queda até 1967, quando se dá o contragolpe nacional desenvolvimentista, que leva este crescimento até o fim do período dos governos militares (Médici, Geisel e até Figueiredo).

Com a Nova República, o neoliberalismo no Governo, implantando o Decálogo do Consenso de Washington, onde se incluem as privatizações e a alienação da soberania nacional, a queda industrial é vertiginosa e nos leva ao período pré-Vargas.

“Após o início da crise econômica que se inicia no final de outubro de 1929, o Brasil, uma economia então predominantemente agrícola, conseguiu uma recuperação muito rápida, com o que, já em 1933, a economia do país ultrapassou em cerca de 8% o seu Produto Bruto de 1929 quando, como se sabe, 1933 corresponde ao auge da crise em muitos dos países desenvolvidos da Europa e da América do Norte” (Eduardo Strachman, Crescimento Econômico Brasileiro (1930-2015) e seus Obstáculos: uma análise histórico-estrutural, Revista de Economia Mackenzie, v. 16, nº 1, São Paulo, Jan./Jun. 2019).

E o que ocorre sob a égide da nova constituição? Responde Eduardo Strachman: “Os industriais passaram cada vez mais a obter receitas via aplicações financeiras no Brasil, absolutamente fora dos padrões internacionais, seja por conta dos juros normalmente entre os maiores (quando não, frequentemente, o maior) do mundo, seja pela combinação desses juros e apreciações cambiais bastante previsíveis, pela atratividade que despertam até mesmo sobre capitais estrangeiros, gerando um cupom (juros + câmbio – risco) que chegou a ultrapassar 40% a.a. É claro que tal cupom e a atração que exerce sobre capitais internacionais, dada a sustentabilidade, no geral, da situação fiscal e à abertura quase completa do país à movimentação de capitais, desde os anos 1990, conduz a política econômica a emitir mais dívida pública, a fim de esterilizar essa entrada, contribuindo de maneira decisiva, também por esse lado para um menor crescimento, devido às dificuldades que essa dívida pública e seu financiamento representam para o setor público e os investimentos deste. (E. Strachman, citado).

1932 acabou vencendo em 2020. O Brasil volta a ser um país exportador de produtos primários, agora com ênfase no petróleo, nos minérios, nos grãos e na proteína animal. Só saímos da monocultura, mas continuamos sendo colônia.

Voltemos à leitura de Alzira Vargas: “durante aqueles longos três meses (9 de julho a 4 de outubro), muitas vezes me perguntei o porquê daquela Revolução. Já aprendera nos livros e em minhas próprias especulações que, em todas as guerras, quaisquer que sejam, encontra-se sempre como motivo determinante uma razão de ordem econômica” (obra citada).

No Brasil sempre haverá um interesse externo, interessado na dominação do País que tem a maior riqueza natural do planeta, e uma inqualificável classe dirigente cujo sonho atual é morar em Miami, por ridículo que nos pareça.

Até mesmo neste aspecto caímos muito, pois os entreguistas até o Golpe de 1964 tinham olhos para Europa, apreciavam o que de melhor as aristocracias do velho continente assaltaram, furtaram e roubaram em todo mundo para o gozo europeu. Hoje, com a empáfia própria dos estultos, se contentam e rejubilam com a produção industrial e cultural de massa. E apesar de terem, no território que desprezam, das mais elevadas criações, verdadeiros produtos de exportação como a música brasileira, entre outras manifestações de um povo mestiço.

Mas cabem-lhes o que está em Mateus 13-13/14: “Por isso lhes falo por meio de parábolas; porque, vendo, não enxergam; e escutando, não ouvem, muito menos compreendem. Neles se cumpre a profecia de Isaías: ‘Ainda que continuamente estejais ouvindo, jamais entendereis; mesmo que sempre estejais vendo, nunca percebereis”.

E a escravidão em que vivem, a todos atinge.

Em 20 de setembro de 1932, quando já mostrava a derrota dos interesses antinacionais, Getúlio Vargas lançava o Manifesto ao Povo de São Paulo. Quão próprias as palavras que o Estadista pronunciava, 88 anos antes dessa realidade que agora nos esmaga:

“A propaganda pela imprensa e pelo rádio, visando impressionar e captar simpatias, obedece ao critério da mentira sistemática e da exaltação demagógica”. Que outras mensagens não nos chegam pelos robôs com volumosas e agressivas fake news?

E quanta verdade Vargas expressava numa única e curta frase, mostrando toda corrupção que se encontrava nas hostes oposicionistas: “mercantilizou-se tudo, inclusive as convicções”.


PEDRO AUGUSTO PINHO – Avô, administrador aposentado.