Por Luiz Carlos Prestes Filho –
A viúva de Carlos Eugênio Paz, Maria Clara Badan Ribeiro, e a diretora de cinema, Isa Albuquerque, em entrevista exclusiva para o jornal Tribuna da imprensa Livre, apresentam o filme documentário CODINOME CLEMENTE. Obra concluída em 2018, que iniciou sua carreira internacional pelos festivais de Los Angeles e Paris, em 2019. Ao longo de 2020 deveria acontecer a apresentação em oito universidades das cidades francesas de Sorbonne, Lyon, Montpellie, Bordeaux, La Rochelle e Toulouse. Mas a falta de recursos impediu esta peregrinação. Isa Albuquerque usa um termo Carlos de Marighella para ilustrar esta saga cinematográfica: “Foi uma guerra de guerrilhas realizar a produção e finalização de Codinome Clemente, com os mais inusitados obstáculos. O mais recente atinge a toda a classe artística e se chama guerra à Cultura.”
Luiz Carlos Prestes Filho: Qual é a atualidade do Comandante Clemente?
Isa Albuquerque – Cerca de duas semanas antes de seu falecimento, em junho do ano
passado, eu fui surpreendida por um telefonema de Carlos Eugênio Paz, o Clemente.
Ele me revelou que estava morrendo, vítima de um câncer agressivo, e que teria uma
sobrevida de, no máximo, um mês, porém, sua morte consumou-se cerca de 15 dias
depois. Nesse telefonema, ele afirmou categoricamente: “ Isa, não há mais lugar no
mundo para um homem como eu. ” Essa afirmação feita pelo personagem-título do
documentário CODINOME CLEMENTE, com quem tive o privilégio de conviver,
pontualmente, durante os últimos dez anos, soou como um novo alerta sobre as
mudanças históricas que fugiram ao controle das gerações que lutaram por um mundo
mais justo. O sonho acabou para aquela geração que teve um projeto socialista para o
país e para o mundo. O desafio da luta armada, assumida por Clemente, juntamente
com seus companheiros da Aliança Libertadora Nacional (ALN), no combate à ditadura
militar, seria uma história pouco conhecida, caso não houvesse um paciente resgate
das ações praticadas pela militância, através dos livros publicados e dos documentários
produzidos, em especial: CODINOME CLEMENTE, sobre o jovem e legendário
guerrilheiro da ALN. Clemente jamais foi preso e nunca foi torturado devido aos
cuidados e estratégias de autopreservação que desenvolveu para si e para seu grupo.
Viveu para ver o fim de seu sonho. Ao lançar olhos para o presente, Clemente assistiu
seus inimigos retornarem ao poder central, pelo voto popular. Como combatente,
pegou em armas em defesa dos direitos do ser humano e pela instituição de um
projeto socialista de poder. No entanto, um defensor da tortura, com um projeto
antagônico, assumiu o comando do país, pela força do voto popular. Assim como
outros documentários de proposta semelhante, lançados recentemente, o meu
objetivo era o de registrar, neste documentário, a memória da geração militante dos
anos 60, através de testemunhos do próprio Clemente, para além dos demais
guerrilheiros sobreviventes aos anos de chumbo que, na clandestinidade, assumiram
todos os riscos das ações extremas de combate ao regime militar com a estratégia da
guerra de guerrilhas. Carlos Eugênio Paz foi o único comandante de grupos de fogo
que realmente abriu os segredos da luta armada. Diante do quadro político
estabelecido na América Latina, nos dias de hoje, a atualidade de CODINOME
CLEMENTE é de advertência contra o fascismo disseminado pela Law Faire que volta a
instalar regimes ditatoriais ao sul do Equador, agora que estamos no epicentro de uma
nova guerra fria.
Prestes Filho: Qual é o legado intelectual do Comandante Clemente? Além de um filme seu legado intelectual renderia livros teóricos?
Maria Cláudia Bandan Ribeiro: Carlos Eugênio deixou um legado de vida e de
determinação na luta. Ele foi o exemplo de entrega do combatente que como o Che
Guevara, lutou até o último homem. Sua luta representa a luta de uma geração
generosa que entregou a vida por um outro projeto de país. Carlos Eugênio foi um
homem da ação, tendo assumido em 1970 o comando militar da ALN em São Paulo.
Escreveu dois livros sobre suas experiências, Viagem à Luta Armada, de 1996
(reeditado em 2008) e Nas Trilhas da ALN, de 1997, deixando um registro histórico e
franco sobre o viver na guerrilha. Foi um homem que viveu sua revolução, trazendo
para a concepção de luta política, o papel da ruptura histórica, já preconizada e
defendida por Carlos Marighella. Ele fez parte desse acúmulo de experiências
concretas, que essa época inaugurou. A Ação Libertadora Nacional (ALN) rompeu com
a ideia de evolução política legal sob a ditadura e com a via eleitoral, reduzida às
causas da burguesia. Para a ALN, o caminho pacífico pós-golpe de 1964 estava
superado. Naquele momento, foi o caminho vislumbrado: Marighella chamava a nossa
democracia de democracia racionada, uma democracia que nominalmente defendia
todos, mas concretamente não defendia ninguém, a não ser as classes dominantes. A
luta armada foi uma estratégia não convencional de luta, mas não um ato de
esvaziamento do pensamento. Portanto, acho que muita discussão teórica a respeito
dela pode ser produzida. Discordo das explicações sumárias como as da frase de que a
ALN “trocou a arma da crítica pela crítica das armas”, ideia que retira o suporte
histórico-social da luta, empobrece a linguagem do engajamento e não mostra as
diferentes etapas de um processo revolucionário. Acredito que junto de uma
desmontagem ideológica das narrativas oficiais de Estado e de suas violências, uma
identidade revolucionária também foi desfeita. A luta armada fez parte do legítimo
direito de defesa dos povos, quando dirigentes como Carlos Marighella, Apolônio de
Carvalho, entre outros, defenderam uma nova ordem revolucionária brasileira. Esta
revolução sacudiu não apenas o Brasil, mas quase toda a América Latina, que combatia
com as armas na mão seus respectivos Estados militares ou em vias de se tornarem
ditaduras sangrentas. Foram momentos ricos de nossa história, ao contrário do que
afirmou Fernando Gabeira, dizendo que a luta armada foi “o erro mais fascinante de
uma geração”. O Brasil precisou também viver essa experiência. A luta armada
inaugurou uma onda de rebeldia e de insubmissão, tendo a radicalidade como
resposta, quando os direitos mais básicos foram retirados, como o direito à vida. Acho
que Carlos Eugênio foi o militante que mais tematizou sobre a violência revolucionária,
pois ele esteve na linha de frente da luta, sendo também o militante mais caçado pela
ditadura, com a cabeça a prêmio pelo DOI-CODI, e condenado a 123 anos de prisão. A
violência revolucionária dentro da interpretação da época e do contexto político em
que ele viveu, também engendrou um conceito de “violência justa”. Foi um recurso
extremado de defesa, um ato valorizado em si e encarado como um gesto libertador
na luta pela autodeterminação dos povos e contra todos os imperialismos da época.
Teve seu berço nos movimentos anticoloniais, em particular após a Guerra da Argélia e
do Vietnã. A luta armada foi uma luta transitória e definida pelas injunções históricas.
Poucos militantes participaram de tantas ações armadas naquele período, como
Clemente. Poucos também foram caçados tão ferozmente como ele. Poucos também
foram aqueles que viveram nas entranhas as exigências da guerra. Aqueles limites da
violência que são, na maior parte das vezes, definidos pela estratégia que a própria
guerra determina. Ele deixou um exemplo e também um alerta sobre os dilemas
revolucionários, as responsabilidades sobre as decisões tomadas, os eventuais erros
numa luta dessas proporções, mas e, sobretudo, mostrou na prática como a resistência
a um estado ditatorial é feita de desprendimento, convicção e entrega.
Prestes Filho: Hoje a luta armada é mais um exemplo de rebeldia e de coragem? Seria
atual essa forma de luta num regime democrático de direito?
Isa Albuquerque: Hoje, o jogo de transformação política e social é feito nas redes
digitais, por influencers que acionam o gatilho da emoção para implantar crenças na
mente do eleitor. Esse instrumental desenvolvido pela atuação da empresa de
consultoria Cambridge Analytic, com uma campanha comandada pelo diretor de
marketing Steve Bennon, a partir da identificação dos desejos e da estrutura mental de
seus usuários, criou conteúdos especialmente destinados a cada usuário do facebook e
do Wattsap afetando, profundamente, os resultados eleitorais dos Estados Unidos e
do Brasil. O documentário Privacidade Rackeada, exibido na Netflix, demonstra como
estamos todos vulneráveis à influência desse tipo de campanha. Somente agora o jogo
está sendo desvendado, com a CPI das Fake News. A transformação de intenções
políticas é feita a partir da persuasão individual, por meio da manipulação da
informação. A Esquerda percebeu, tarde demais, quais eram as novas armas do jogo.
E sendo direcionada por conceitos de ética é, moralmente, impedida de persuadir por
meio da mentira – o que não tem sido um problema para a extrema direita. Vivemos
na era da pós-verdade, em que as pessoas julgam verdadeiras suas próprias crenças.
Acreditam no terraplanismo, na mamadeira de pênis e no kit gay, que são campanhas
criadas para influenciar o eleitorado conservador, iletrado e fundamentalista do Brasil.
O fazer político respalda-se, atualmente, nos anseios individuais. Na era dos pós-verdade, o campo de batalha da esquerda é a mente do eleitor, onde seu grande desafio é neutralizar a influência das fake News e retomar a liderança da narrativa “do bem comum”, nas redes sociais, já que o voto tornou-se apenas a assinatura final que legitima as “democraduras” instituídas pelo neo-colonialismo. Portanto, o novo debate consiste em reconquistar o poder da Narrativa de Esquerda que talvez tenha que passar pelo restabelecimento da verdade clássica: Aquilo que É! Talvez por essa razão Carlos Eugênio Paz tenha se reconhecido como um ser político do século XX, ao rever sua trajetória de vida declarando seu desconforto com esses novos tempos.
Maria Cláudia: Acho que Isa respondeu muito bem. Poucas semanas após a morte de
Carlos Eugênio, seu nome também foi alvo de Fake News, sendo acusado pela morte
de Fernando Santa Cruz, pai do atual presidente do Conselho Federal da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. A luta armada foi uma experiência que
ocorreu dentro de um contexto específico, de silenciamento da oposição e de uso da
violência extrema contra reformas sociais em marcha. Ela foi uma das estratégias de
luta adotadas, quando as vias legais estavam esgotadas. Nesse sentido, ela é datada.
Os desafios dos dias de hoje são diferentes. Como disse Isa Albuquerque, a esquerda
precisa recuperar sua narrativa perdida. E para isso, reincorporar suas lutas. Gostaria
apenas de fazer algumas ressalvas a respeito da guerrilha no Brasil. Os analistas da luta
armada sempre se concentram em falar da derrota ou da vitória, esperando uma
política de resultados, sem compreender a ditadura e o que ela custou à sociedade
brasileira. A luta armada é parte das lutas a serem integradas à nossa história, e não
descartada. Não houve exatamente uma “crise do sujeito revolucionário”. O que houve
foi um pacto de silêncio e um acordo durante a transição democrática quando a
plataforma de direitos humanos começou a prosperar e a influenciar parte da
esquerda no exílio. E a ser adotada no Brasil com poder mobilizador e reintegrador da
sociedade, para que parcelas da oposição também ocupassem as estruturas de poder,
e aos poucos permitir que ex-perseguidos políticos fossem candidatos às eleições. Foi
uma estratégia. A ideia de direitos humanos na esquerda armada também é tardia, e
está muito associada à política norte-americana de Jimmy Carter no exterior. A
esquerda nunca se furtou de denunciar tortura e violações aos direitos humanos que
também fazia parte de uma política de desmoralização da ditadura civil-militar no
exterior, ocupando grande parte do tempo dos exilados políticos brasileiros e dos
presos políticos. Ela também foi responsável por criar uma espécie de rede de
sensibilização no exterior contra o autoritarismo, o imperialismo, a violência, a
exploração econômica, o atraso social. Na militância mais profissionalizada, porém, a
campanha dos direitos humanos evocava mais uma “autoridade moral” do que
política. O assunto é bastante vasto para ser tratado aqui, e implica na própria criação
do Tribunal Bertrand Russell para o Brasil. O que eu gostaria de dizer é que todas as
nossas experiências radicais foram mantidas em silêncio, para acomodarem-se a estes
“novos ventos democráticos”. No final dos anos de 1990, em uma crônica para um
jornal, Frei Betto afirmou: “ainda somos acanhados em matéria de resgate dos nossos
anos de chumbo”. Gabeira por outro lado, e como já dito, chamou a este período,
como “o erro mais fascinante de uma geração”. Precisamos nos perguntar que
imaginário político queremos deixar. Alimentamos sempre uma cultura da derrota? A
sensação de perda que aparece em muitas narrativas desta época, se deve a esta
“neutralização moral” provocada por uma Anistia incompleta: os desaparecidos não
voltaram, os culpados de atrocidades ainda estão em liberdade e um projeto de Brasil
foi destruído. A distensão lenta gradual e segura se realizou sob um poder ditatorial
camuflado que mantinha uma política de extermínio a portas fechadas, como um
memorando desclassificado da CIA veio demonstrar, indicando que o presidenteditador Geisel autorizou junto a João Baptista Figueiredo, então chefe do SNI, que a execução de “subversivos” deveria continuar. Este documento indica que os militantes não eram doidivanas, que os ditadores não eram bonzinhos, e que para se encurtar a
ditadura, é preciso que se conheça mais sobre ela. A luta armada não é a culpada da
falência geral da política no Brasil. Ela propôs uma ruptura justamente em relação a
esta cultura política que vivemos hoje. E ela não foi adotada apenas no nosso país, ela
esteve presente numa América Latina coalhada de ditaduras, fazendo parte de uma
resistência de larga escala, e com enorme dinamismo internacional. O caso chileno
mostra que mesmo lá uma luta realizada por vias pacíficas e com apoio da massa, não
prosperou e foi duramente golpeada. Allende tinha dispositivo militar e armas à sua
disposição e decidiu não usá-los. Se considerarmos a luta armada um erro estratégico,
teríamos que dizer que todas as outras lutas brasileiras também o foram, pois
nenhuma saiu vencedora. Precisamos discutir um sentido: o da conciliação de classes e
o que isso implica. Também devemos nos perguntar de que forma essa democracia,
enquanto um valor universal vago foi capaz de anular o ideário socialista. É curioso
este debate sobre o erro no interior da luta armada. Argentinos dizem que erraram
porque a prática seguiu a teoria, perdendo a relação com a realidade concreta. E os
brasileiros dizem que se deu mais margem à prática e às ações do que à teoria. Explicar
o menosprezo democrático pela militância armada também parece insuficiente para
compreender o que chamam de derrota ou de erro estratégico da esquerda armada.
Precisamos entender quais são as forças que legitimaram algumas lutas e não outras. E
isso está relacionado à estigmatização da militância latino-americana como um todo e
à mutação de um discurso. Precisamos discutir com profundidade os contornos
democráticos das esquerdas, a via institucional para o socialismo, a via armada, e a
democracia como ponto de chegada ‒ esta democracia, como um corpo teórico
elástico, sem muita claridade, em diferentes formas e conteúdos democráticos,
desalojando o campo marxista. A raiz está no plano teórico ou é fundamentalmente
política? Uma grande discussão que tem sido feita hoje pelos chilenos é dos contatos
no exterior terem proporcionado uma ponte em direção ao reformismo. Até o
presente momento, as pesquisas históricas sobre o confronto armado no Brasil
concentraram-se mais em mostrar suas fraquezas e debilidades, seu modo de atuação
no país e as maneiras com que foi destruído ou dizimado pelo Estado repressor. Os
interesses a respeito deles recaem, sobretudo, sobre seus “aspectos psicológicos
coletivos”, como a obsessão pelo poder ou pela autoridade, falta de organização,
verborragia excessiva, machismos ou mesmo tanatomania. Precisamos nos perguntar
o que foi feito com aquelas ideias que marcaram a história da cultura política brasileira
e que quebraram tantas barreiras no passado. Se as forças progressistas e
emancipatórias naqueles anos estavam circunscritas à linguagem da revolução e do
socialismo, caberia perguntar, como fez Boaventura de Sousa Santos, se a política de
hoje, que recorre à linguagem dos Direitos Humanos, é capaz de preencher o vazio
deixado pelo socialismo mobilizando as mesmas forças de oposição, dada sua “crise
aparentemente irreversível”. Acho que vivemos este retrocesso em parte por não
assumir nossas verdadeiras lutas, em não considerar a dimensão que elas tiveram para
o país. Publiquei um livro, resultado de minha tese de doutorado na USP, sobre as
guerrilheiras da ALN. Os relatos da grande maioria delas procuraram salientar as
diferentes maneiras do enfrentamento político, trazer a pluralidade de vozes e
momentos existentes num processo revolucionário sem resvalar para uma crítica que
considere a resistência armada como uma veleidade política, uma política de sujeição
de quadros ou de resultados de proporções limitadas. Para dar respostas satisfatórias
a estas questões é necessário, portanto, tecer tramas mais complexas e nuançadas das
experiências de luta, recuperar o quadro de pensamento da época, explorar a
dinâmica do compromisso político e o que ele ensejou naqueles anos. Ensinar aos
jovens o que foi a ditadura, e explicar como se perpetua historicamente uma cultura
de violência e de desigualdade, que permite nos dias de hoje a existência de novos
desaparecidos, de violência e discriminação crescentes contra mulheres, negros
e LGBTQi+ e de uma justiça que à semelhança da que vigorava na época da ditadura,
assume um papel de condutora do Estado. Se a política de memória, verdade e justiça
no país fosse uma real prioridade, não estaríamos na situação atual, de completo
negacionismo da ditadura, de recuperação de uma política da Guerra Fria e de
menosprezo por todos os que se engajaram na luta, convertidos novamente em
perigosos subversivos.
Prestes Filho: No momento quando o governo federal questiona a importância
histórica de Zumbi e de Marighela, do Almirante Negro e do Cavaleiro da Esperança,
vocês buscam realizar um filme sobre um revolucionário. Qual é o tamanho do desafio?
Isa Albuquerque: Eu respondo por essa produção, direção e roteiro, que me tomou
dez anos de vida. O filme foi concluído em 2018 e iniciamos sua carreira internacional
pelos festivais de Los Angeles e Paris, no ano passado. Essa carreira por festivais teria
continuidade, ao longo de 2020, com a peregrinação em 8 notáveis universidades
francesas, dentre elas Sorbonne, Lyon, Montpellier Bordeaux, La Rochelle, Toulouse,
dentre outras, com exibições e palestras agendadas a serem realizadas por mim e
Maria Cláudia, a fim de criar a publicidade necessária para o lançamento em salas de
Cinema – pois a derradeira etapa de execução de um projeto cinematográfico é a sua
exibição pública. Como começaríamos a realizar essa tournée em Março, após a
captação de cerca de um pequeno valor pela Vakinha On Line, fomos obrigadas a
desistir desse plano por conta da crise sanitária que fechou espaços e eventos
públicos, além das fronteiras da Europa. Pelo menos já contamos com as passagens
aéreas internacionais, que são válidas até dezembro. Há 4.000 projetos
cinematográficos paralisados pelo Fundo Setorial do Audiovisual gerido pelo BRDE/
FSA, dentre eles o CODINOME CLEMENTE Distribuição, cujo valor já aprovado e
publicado em Diário Oficial, desde 19/12/2018, após um processo seletivo que se
arrastou desde 2016, ainda se encontra paralisado à espera do contrato. O filme está
pronto. Pronto! Temos uma distribuidora – O2Play – que pertence ao Fernando
Meirelles. Mas a distribuidora só começa a execução dessa etapa por meio de
contratação a ser feita com a liberação do referido recurso aprovado. Atualmente,
muitas produções estão movendo ações judiciais, com vistas à liberação de seus
recursos, que se encontram contingenciados pelo ministério da Economia. São mais
de 2 bilhões de reais, gerados pela própria atividade com impostos sobre cada produto
audiovisual registrado na ANCINE. Como é “dinheiro carimbado”, só pode ser revertido
para a própria atividade. Então o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, mantém esse
recurso gerando dividendos para a União tendo repudiado, recentemente, uma ação
de advogados defensores das associações de cineastas com vistas a direcionar os tais
dividendos à atividade, juntamente com a liberação dos R$2.3 bilhões. Enquanto isso
produtoras quebram e, com a suspensão das linhas de produção, 350 mil empregos da
Cultura, desaparecem por ano. Para sanarmos compromissos de finalização,
preexistentes, além de reativarmos o lançamento internacional e viabilizarmos a
campanha nacional de difusão do filme, incluindo os custos judiciais, dentre outros,
estamos retomando a campanha de arrecadação pelo site Vakinha on Line. Quem
quiser realizar contribuições ao projeto de lançamento, basta visitar o site da
campanha pelo link abaixo:
CODINOME CLEMENTE DISTRIBUIÇÃO / FAIRE UN DON
Prestes Filho: O filme busca registrar essa situação de conformismo institucional?
Isa Albuquerque: Um filme não é sobre política e sim sobre sentimentos. A política é o
pano de fundo, a teia onde se instalam razões e emoções. Carlos Eugênio Paz era um
defensor apaixonado dos direitos dos seres humanos. Busquei filmar seu sistema de
crenças, bem como, sua subjetividade. Traçando o seu perfil de jovem de 16 anos,
capaz de atitudes extremistas para defender um ideal partilhado por cerca de 36
organizações clandestinas, ao homem maduro envolto em suas lembranças criando,
assim, o retrato da resistência formada por sua própria geração contra um regime
opressor. Eu optei por escolher uma narrativa entre observativa e performática,
elipsando quase que inteiramente a minha presença da cena, para deixar Clemente
contar a sua história, o que gerou uma narrativa de ação. Na definição do jornalista
Franklin Martins, ex-guerrilheiro do MR-8, o filme CODINOME CLEMENTE é fiel ao
próprio Clemente. E retratando o Clemente, como um ícone de seu tempo, eu
consegui elaborar um retrato de sua geração. Conhecer a fundo essa geração que veio
antes da minha era o meu objetivo paralelo.
Prestes Filho: Quanto tempo de material gravado vocês tem do Comandante Clemente?
Isa Albuquerque: Foram gravadas 45 horas, basicamente, em 2012, com um pequeno
recurso inicial. Os documentários são filmes de valor menor na produção do que na
etapa de finalização, quando cresce em imagens de arquivo, animações e projeto de
montagem. Entre 2012 a 2016 passei inscrevendo o projeto inacabado nos editais de
finalização. E apesar de quase inteiramente rodado, com filmagens comprovadas, os
especialistas sempre recusavam aprovar o recurso necessário ao seu término. O que
somente aconteceu em 2016, quando as filmagens foram complementadas, em
estúdio, com a captação do testemunho máster de Clemente, em estúdio. Após a
montagem, realizada pela experiente Jordana Berg e ilustrada com animações e
imagens de arquivo, em parte levantadas em Cinematecas internacionais e em parte
cedidas por Sílvio Da Rin e pelo Roberto Chaim, a quem agradeço pela inestimável
contribuição, temos um longa-metragem de 101 minutos. Pronto. Só nos falta cumprir
a etapa da difusão, exibição e comercialização.
Prestes Filho: A cultura brasileira hoje não tem ministério. Os movimentos culturais
perderam potência no país. Como vocês imaginam a circulação do filme pronto e
finalizado?
Isa Albuquerque: Por exigências da ANCINE, nós precisamos estrear em salas de
Cinema. Com a restrição do isolamento social pretendemos recorrer ao Cine Drive In,
da Pandora Filmes, em São Paulo e às plataformas de Streaming, tais como Netflix e
Amazon. O Canal Brazil é coprodutor do longa metragem e será a nossa terceira janela
de exibição. Temos uma distribuidora profissional, a O2Play, comprometida com o
longa-metragem, porém, exige o pagamento do recurso necessário à sua divulgação. O
tal recurso no valor de R$200.000,00 (duzentos mil reais) já aprovado, encontra-se
mantido sob contingenciamento. Estamos buscando levantar R$280.000,00 através do
site Vakinha On Line, a fim de executar os planos Nacional e Internacional de
lançamento. É bom esclarecer que o recurso do FSA não pode ser utilizado no exterior
e, portanto, tais recursos de arrecadação independente, são a nossa alternativa para
reativação do plano internacional de lançamento, assim que reabrirem as fronteiras.
São muitos os desafios a serem enfrentados. Para vencermos a guerra cultural estamos
articulando um movimento de abrangência nacional intitulado Estados Gerais da
Cultura. Precisamos “sair das cordas” para ocupar o cenário cultural, que nos cabe.
Essa importante iniciativa é do cineasta Sílvio Tendler e já conta com mais de cem
adesões. Parece utópico e é, diante do atual cenário de terra devastada a que foi
submetida a Cultura. Mas somos utópicos, pois somos artistas. Como escreveu o poeta
espanhol Antônio Machado Ruiz: “Caminhante, não há caminho. O caminho faz-se ao
andar. Golpe a golpe. Verso a verso”. Em nosso caso, filme a filme.
LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Cineasta, formado na antiga União Soviética. Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009). É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).
MAZOLA
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