Redação

O MPF (Ministério Público Federal) entrou com ação de improbidade administrativa contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, acusado de desestruturação dolosa das estruturas de proteção ao meio ambiente. Na ação, 12 procuradores pedem o afastamento do ministro do cargo em caráter liminar (urgente) e sua condenação por improbidade administrativa. Eis a íntegra do pedido (3 MB).

Para o MPF, Ricardo Salles promoveu a desestruturação de políticas ambientais e o esvaziamento de preceitos legais para favorecer interesses que não têm qualquer relação com a finalidade da pasta que ocupa. O processo de desestruturação do sistema de proteção ambiental brasileiro, afirmam, foi realizado por atos, omissões e discursos do acusado, em conduta dolosa (intencional) com o objetivo de fragilizar a atuação estatal na proteção ao meio ambiente.

É possível identificar, nas medidas adotadas, o alinhamento a um conjunto de atos que atendem, sem qualquer justificativa, a uma lógica totalmente contrária ao dever estatal de implementação dos direitos ambientais, o que se faz bastante explícito, por exemplo, na exoneração de servidores logo após uma fiscalização ambiental bem sucedida em um dos pontos críticos do desmatamento na Amazônia Legal”, diz a ação judicial.

O ministro exonerou, no final de abril de 2020, 3 coordenadores da fiscalização ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente: Olivaldi Azevedo, Renê Oliveira e Hugo Loss. As exonerações ocorreram após ações de fiscalização nas terras indígenas Ituna Itatá, Apyterewa, Trincheira-Bacajá e cachoeira seca, na região de Altamira, onde as equipes do Ibama conseguiram reduzir o desmatamento após o aumento, em 2019, que chegou a 754%. Nas operações, que ocorreram no mês anterior às suas exonerações, os fiscais destruíram cerca de 100 máquinas e equipamentos utilizados por quadrilhas para cometer crimes ambientais, número superior ao de todo ano de 2019.

A ação judicial do MPF enumera atos, medidas, omissões e declarações de Ricardo Salles que considera ter inviabilizado a proteção ambiental e, assim, “contribuíram decisivamente para a alta do desmatamento e das queimadas, sobretudo na região amazônica“.

Os resultados são consequência direta da série de medidas que Ricardo Salles tomou para enfraquecer a proteção ambiental“, diz nota divulgada pelo órgão. “Com ele no comando da área, o país teve, no mesmo ano das maiores altas do desmatamento, o menor número de multas por crimes ambientais em 20 anos. Ele também foi responsável por reduzir em 25% o orçamento do meio ambiente e por paralisar o Fundo Amazônia, deixando de receber investimentos vultosos que poderiam estar sendo utilizados para ações de preservação da floresta.”

GASTOS X EFICÁCIA

Os procuradores destacam que a operação de GLO (Garantia de Lei e Ordem) com atuação do Exército na Amazônia custou, em 2 meses, mais de R$ 124 milhões, o que representou aproximadamente R$ 14 milhões a mais do que todo o orçamento anual previsto para ações de comando e controle pelo Ibama no ano de 2019.

Ressalte-se que tal operação se deu apenas quando a situação das queimadas na região amazônica tomou proporções desmedidas e o fogo ganhou repercussão negativa internacional. Como elas ocorrem no período de seca amazônica, que começa em julho e vai até novembro de todo ano, a desproporcionalidade das queimadas ocorridas em 2019 era consequência previsível e evitável por meio da efetivação escorreita da política ambiental, disciplinada em vários regramentos legais, inclusive em atos próprios e já tecnicamente balizados pelo Ministério do Meio Ambiente, como o PPCDAm – Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia”, diz o MPF.

O MPF explica na ação que, ao reduzir o orçamento da área ambiental, Ricardo Salles não fez economia e, ao contrário, provocou gastos muito maiores com a realização da operação das Forças Armadas na Amazônia que, apesar de ter reduzido as queimadas ano passado, não vem conseguindo reduzir o desmatamento. Para o MPF, também é 1 ato de improbidade subordinar o Ibama, que é o órgão de Estado com capacidade técnica de fazer fiscalização ambiental, às Forças Armadas, a quem tal tarefa não pertence. A GLO foi reeditada em maio desse ano, supostamente para fazer frente ao crescimento constante do desmatamento –em todos os meses de 2020 o desmatamento foi maior do que nos mesmos meses de 2019.

A Procuradoria afirma que, ao analisar os resultados obtidos pela GLO, não foi constatada redução no desmatamento acima daquilo que era alcançado pelos fiscais do Ibama.

Os efeitos da fragilização da estrutura administrativa, são imediatos, como mostram os dados sobre o aumento do desmatamento e o avanço de atividades econômicas ilegais sobre áreas de floresta nativa, incluindo áreas especialmente protegidas, como terras indígenas e unidades de conservação. A desregulamentação de medidas proibitivas, a desmobilização de servidores e o desmonte da fiscalização consistem em frentes permanentes de fragilização dos órgãos ambientais federais. Em muitos casos, os efeitos podem se tornar irreversíveis”, dizem os procuradores.

REUNIÃO MINISTERIAL

Para o MPF, as declarações dadas por Ricardo Salles na reunião ministerial de 22 de abril “escancararam os propósitos de sua gestão e o desvio de finalidade nos atos praticados”.

Na ocasião, Salles disse que considerava a pandemia uma “oportunidade” para modificar normas e adotar atos. Também sugeriu fazer uma “baciada” de alterações e “passar a boiada“.

As declarações apenas expõem, de forma clara, o que diversos atos já confirmavam: existe um verdadeiro encadeamento premeditado de atuar contrário à proteção ambiental, caracterizando o dolo, elemento subjetivo dos atos de improbidade. Analisando os fatos concretos, desde o início de sua gestão à frente do MMA, o ministro tem adotado inúmeras iniciativas em flagrante violação ao dever de tutela do meio ambiente, como a desconsideração de normas, critérios científicos e técnicos, em desrespeito aos princípios ambientais da precaução, da prevenção e da vedação do retrocesso”, diz o MPF.

OUTRO LADO

Em nota divulgada pela comunicação do Ministério do Meio Ambiente, Salles disse que a representação tem “evidente viés político-ideológico” e é embasada em “argumentos improcedentes“. Eis abaixo a íntegra:

A ação de um grupo de procuradores traz posições com evidente viés político-ideológico em clara tentativa de interferir em políticas públicas do Governo Federal. As alegações são um apanhado de diversos outros processos já apreciados e negados pelo Poder Judiciário, uma vez que seus argumentos são improcedentes.”


Fonte: Poder360