Por Luiz Carlos Prestes Filho

O isolamento social foi cruel afirma Márcio Gomes: “Eu adoro passear sem motivo pelo Rio de Janeiro, fazer visitas inesperadas. Até me acostumar com esse novo jeito de vida foi difícil. Mas, por outro lado, comecei a meditar sobre o que sou e sobre o mundo que me cerca. Nesta reflexão percebi que tinha chegado a hora de valorizar o essencial e não as coisas pequenas que acumulei. Abri meu armário, fiquei espantado, quantas roupas eu não usava mais; abri as gavetas da mesa do escritório, encontrei uma papelada inútil. Durante a quarentena percebi que o viver tem que sempre estar acima do material. Quanta falta me faz um abraço, um olhar e o carinho. Da vida se guarda o que se vive”.

Com a Covid-19 veio o cancelamento de 10 shows programados no Rio de Janeiro e, lamentavelmente, a desmarcação da turnê nordestina do espetáculo em homenagem ao centenário de Nelson Gonçalves, que já estava contratado: “Eu tinha ensaiado e gravado com uma orquestra sinfônica de São Paulo o repertório do nosso menestrel maior, o genial interprete da “Volta do Boêmio” do querido Adelino Moreira. Pretendia dar continuidade a essa justa homenagem. Iria visitar Pernambuco, Paraíba, Bahia e outros estados com um espetáculo que fez sucesso nos palcos cariocas e paulistas. Mas vou batalhar para que isso aconteça em 2021”.

O cantor reconhece que não tinha a menor ideia de que as atividades culturais seriam as primeiras a entrar em colapso durante a crise sanitária, mas percebe que estas serão as últimas a voltarem a normalidade: “Lembrei da formiguinha que durante o verão busca o essencial – a luz do sol, o calor da vida – para conseguir atravessar o duro o inverno que vai chegar. Outra vez, acumulamos bobagens, deixamos de cuidar do essencial. Desta maneira eu, como a maioria dos artistas que conheço, fiquei sem qualquer alternativa. A ajuda do governo não chegou. As lives patrocinadas são somente para os grandes nomes da mídia. Os artistas, independente da qualidade, tem que se virar. Eu, por exemplo, fiz lives com uma empresa de eventos que pagou a imagem e a sonorização, pude disponibilizar a minha conta bancária para os interessados em colaborar”.

Seguro de que o fim da pandemia virá muito em breve, Márcio Gomes, diz que tem fé de que a arte voltará mais forte e consciente: “Sonho grande é a vacina, mas claro que o palco para mim é fundamental. Nas lives que fiz e faço não escuto os aplausos, isso dói, traz um bocado de tristeza. Imagino que no início os meus futuros shows serão ao ar livre, assim poderei facilitar a presença de púbico, evitar aglomerações em locais fechados. Tenho a certeza de que vou transformar a pandemia da dor na pandemia do amor. A música romântica do Brasil merece!”


LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Cineasta, formado na antiga União Soviética. Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009). É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).