Por Ricardo Cravo Albin –
“Os governos são para fazer bem com o pão próprio, e não para acrescentar os bens com o pão alheio”. (Pe. Antônio Vieira)
O Brasil parece destinado a andar para trás, e a provocar desgostos e apreensões aos cidadãos que de fato o amam e o querem maior e mais justo. Nunca saiu do meu coração o tema principal do discurso do patrono da minha turma na Faculdade Nacional de Direito em 1963, o jurista e professor Hermes Lima, ao enfatizar tese resumida na frase “qualquer projeto de lei só pode ser ético quando assinala avanços, jamais retrocessos.”
Há pouco um grave susto, logo desalento, arrebatou corações, a aprovação de mudanças por larga maioria da Câmara Federal na Lei de Improbidade Administrativa. E o pior: por situação e oposição. Ou seja, os extremos políticos, até eles, parecem coincidir em que a corrupção quanto mais liberada e leniente, o melhor. Acudo-me de síntese brevíssima para lembrar que a Lei de Improbidade de 1992 seria o principal instrumento jurídico para combater a corrupção no país. Com a aprovação naquele ano da Lei das Organizações Criminosas, ambas dariam parto a uma nova era de ações contra corruptos, cujo maior exemplo foi a Operação Lava Jato.
Mas, logo enfatizo com letras maiúsculas: a Lei da Improbidade continuaria essencial em casos de desvios, enriquecimento ilícito ou ganhos por vantagem indevida. Tenho em mãos estatísticas do Conselho Nacional de Justiça a afiançar que o avanço do combate à corrupção assinalou um aumento nas condenações por improbidade de cerca de 1.300 em 2014 para mais de 2.500 em 2018. Neste mesmo ano, uma comissão foi encarregada de sugerir “alterações para aperfeiçoar” a Lei. Já ali, no refluxo da onda anticorrupção da Lava Jato, o Parlamento, escaldadíssimo, queria enfraquecer a Lei.
Os argumentos do novo texto deste ano significam uma linha de fumaça bem ardilosa para facilitar a vida dos corruptos.
É o caso da exigência de que se comprove o dolo, ou a intenção expressa do agente em roubar. Alguém de boa-fé imaginaria que malfeitores deixariam claras suas intenções de praticar corrupção? Caso vivêssemos na Suécia, seria cabível que o roubo fosse justificado por banal errinho administrativo. Mas aqui? aqui? A inclusão na nova Lei do nepotismo deve ser analisada com lupa pelo Senado entre os atos sujeitos à punição, como igualmente o aumento da pena para suspenção de direitos políticos dos criminosos-larápios do bem público.
Agora, em vias de serem revistas pelo Senado as mudanças comprometedoras inseridas pelos deputados a toque de caixa, a consciência limpa da nação espera que a ampla margem da Câmara enfrente forte resistência a esse insulto à cidadania. Senadores ligados a partidos que na Câmara apoiaram o anteprojeto em peso se manifestaram nos últimos dias contra a proposta do relator, o deputado Carlos Zaratini (PT-SP), ao que se sabe apoiado por setores do Palácio do Planalto.
Há um grupo extremamente animador na Casa Alta, o “Muda Senado”, que promete à imprensa que lutará contra a corrupção. Este grupo, criado ao início da legislatura, tem a Operação Lava Jato (malvista por motivos óbvios pela maioria da Câmara) como referência, e defende a bandeira da prisão em segunda estância – poderoso bloqueio ao curso da impunidade para os mais poderosos. Aliás, eles tentaram sem sucesso instituir uma CPI da Toga, para investigar excessos de algumas esferas do judiciário.
O fato concreto, razão dessas minhas palavras de agora, é que continuamos convivendo com a corrupção e com os insustentáveis vícios da Velha Política. E essa flexibilização da Lei da Improbidade vem contra iniciativas absolutamente moralizadoras como a Operação Lava Jato e a Lei da Ficha Limpa.
Fiquei apreensivo – como certamente todos os que votaram nele – com o Presidente Bolsonaro a declarar há dias apoio ao projeto. Logo ele que se elegeu com o tema da anticorrupção… Alegou que muitos prefeitos de cidades pequenas são enquadrados em denúncias de improbidade e arcam com projetos por até 20 anos.
Uma pena que o Presidente não tenha lido as estatísticas aqui citadas ao começo desta breve advertência, também um pedido de ajuda quase desesperado da cidadania ao Senado Federal.
RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
MAZOLA
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