Por José Carlos de Assis

A decisão do Uruguai de fazer um acordo comercial com a China não é desfavorável apenas ao Uruguai. É desfavorável também ao Brasil e à Argentina, assim como, através desses países que têm fronteiras terrestres com ele, ao Paraguai e às demais nações que lhe estão próximas.

Produtos chineses que entrarem no Uruguai sem pagar tarifas alfandegárias chegarão nas mesmas condições ao Mercosul, cujos membros não cobram tarifas de importação entre si, dificultando uma estratégia de desenvolvimento comum no sul do continente com base em proteção tarifária.

Daí o esforço do presidente Lula em fazer o presidente do Uruguai, Luis Alberto Lacalle Pou, compreender o prejuízo que o acordo individual de seu país com a China poderá representar para seus vizinhos do Mercosul e de outros países da região. Todos serão afetados pela forte concorrência de produtos chineses.

O Uruguai não tem produtos industriais relevantes para vender para a China. Sua base econômica de exportação  se limita à soja (com um valor de US$ 10 bilhões em 2019). Milho, cevada, trigo, sorgo e aveia são os outros cereais cultivados no país. Entretanto, sem perspectiva de desenvolvimento industrial, o país está condenado à estagnação, pois produção agrícola não garante expansão tecnológica.

A integração no Mercosul seria sua melhor alternativa, pois poderia se aproveitar de acordos industriais e tecnológicos realizados numa base comum com a própria China. Como o presidente Lula ressaltou na reunião de Buenos Aires, ao Brasil interessam acordos com a China com os mesmos objetivos do Uruguai.

Embora o Uruguai seja um país pequeno, sua saída do Mercosul seria uma perda estratégica para o continente. Com a volta do Brasil à política regional, sua atuação, anunciada pelo presidente na reunião da Celac, é no sentido de que estamos em época de reconstrução de relações com o mundo, inclusive em nível de blocos.

O próximo passo será provavelmente a retomada de uma política vigorosa no âmbito do BRICS, que provavelmente incorporará a Argentina e países asiáticos. Em seu governo, Bolsonaro, por razões ideológicas, praticamente abandonou o bloco. É hora de voltar. Eventualmente, inclusive para discutir uma moeda comum, objetivo que economistas neoliberais simplesmente descartam por preconceito pró-dólar, desconhecendo as mudanças geopolíticas que estão acontecendo no mundo.

Se o presidente Lacalle levar em conta todas essas questões de interesse de seu país e do mundo, talvez ouça o conselho de Lula. É que não se trata apenas de uma posição brasileira. Afinal, literalmente todos os países do Mercosul se posicionaram contra a posição uruguaia.

Ainda há tempo para ele recuar, se não quiser quebrar o principal pacto político-econômico sul-americano.

JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, escritor, colunista e membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Professor de Economia Política e doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 25 livros sobre Economia Política; Foi professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é pioneiro no jornalismo investigativo brasileiro no período da ditadura militar de 1964; Autor do livro “A Chave do Tesouro, anatomia dos escândalos financeiros no Brasil: 1974/1983”, onde se revela diversos casos de corrupção. Caso Halles, Caso BUC (Banco União Comercial), Caso Econômico, Caso Eletrobrás, Caso UEB/Rio-Sul, Caso Lume, Caso Ipiranga, Caso Aurea, Caso Lutfalla (família de Paulo Maluf, marido de Sylvia Lutfalla Maluf), Caso Abdalla, Caso Atalla, Caso Delfin (Ronald Levinsohn), Caso TAA. Cada caso é um capítulo do livro; Em 1983 o Prêmio Esso de Jornalismo contemplou as reportagens sobre o caso Delfin (BNH favorece a Delfin), do jornalista José Carlos de Assis, na categoria Reportagem, e sobre a Agropecuária Capemi (O Escândalo da Capemi), do jornalista Ayrton Baffa, na categoria Informação Econômica. Autor de “A Era da Certeza”, que acaba de ser lançado pela Amazon. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

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