Por José Carlos de Assis

O editorial do Globo desta sexta-feira, dia 4 de novembro, adverte que “Governo Lula não deve ter uma nova licença para gastar”. E acrescenta, no tom autoritário e arrogante característico dos Marinho: “Eleição não foi uma autorização para criar despesas sem limite, nem para aumentar a carga tributária”.

Peço licença aos donos do Globo para sustentar a opinião oposta. Se há um recado claro das urnas é que as eleições vieram para afirmar a “licença para gastar” em projetos de interesse público, inclusive pela inclusão dos pobres no orçamento. Foi o que prometeu Lula em sua campanha, o que o povo aprovou e o que ele vai fazer.

Quanto à advertência adicional de que a eleição “não foi uma autorização para criar despesas sem limite, nem para aumentar a carga tributária”, trata-se de outra farsa das classes dominantes. Se tivéssemos uma política fiscal menos restritiva e estúpida, poderíamos de fato ampliar gastos sem criar tributos, recorrendo à Teoria Monetária Moderna. Mas isso seria injusto do ponto de vista distributivo, pois deixaria de fora da tributação os US$ 30 bilhões que os Marinho têm em paraísos fiscais enquanto outros milhões de brasileiros estão passando fome.

A ampliação do gasto público por simples criação de moeda é da essência da Teoria Monetária Moderna, quando o país dispõe de suficientes recursos internos como matérias primas ou insumos, ou pode comprá-los no exterior. Mas os neoliberais insistem em rejeitá-la. Não há nenhum risco inflacionário nisso. De fato, se o Estado brasileiro cria a própria moeda, e garante o valor da moeda com a tributação, ele não pode quebrar. Pode, sim, em certas circunstâncias, gerar inflação, mas isso apenas quando o déficit público se destina a financiar projetos ruins e improdutivos. Havendo planejamento adequado de investimentos bons o risco dos projetos cai, a produção/oferta ultrapassa a demanda, e não há desequilíbrio inflacionário. É assim que as economias crescem.

A obsessão contra o déficit público faz parte do principal mantra dos defensores da especulação financeira desenfreada, em tempos de globalização. O manejo do déficit pelo aumento da taxa de juros é a forma de alimentar o que chamo de “economia da especulação” em face da “economia da produção”. Quando, em nome do equilíbrio orçamentário, do superávit primário ou do teto de gastos o Estado gasta o que arrecada, ou até menos, retira-se dinheiro da economia, a produção cai, a taxa de juros tende a subir e o câmbio, a cair. O resultado é estagnação.

A situação oposta é quando se realiza um “saudável” déficit orçamentário. Ele ocorre quando esse déficit corresponde ao financiamento de bons projetos conduzidos direta ou indiretamente pelo governo. Esses bons projetos geram produção e oferta, e mais oferta atende aos requerimentos da demanda, contrapondo-se à inflação. É o mais antigo princípio da economia: a inflação é um desequilíbrio entre oferta e demanda, não um problema monetário, como sustentam os monetaristas e os neoliberais. Para estes, combater a inflação é reduzir a demanda e a quantidade de moeda em circulação, gerando desindustrialização e desemprego.

Já para os desenvolvimentistas, combater a inflação é aumentar a produção e a oferta!

JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, escritor, colunista e membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Professor de Economia Política e doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 25 livros sobre Economia Política; Foi professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é pioneiro no jornalismo investigativo brasileiro no período da ditadura militar de 1964; Autor do livro “A Chave do Tesouro, anatomia dos escândalos financeiros no Brasil: 1974/1983”, onde se revela diversos casos de corrupção. Caso Halles, Caso BUC (Banco União Comercial), Caso Econômico, Caso Eletrobrás, Caso UEB/Rio-Sul, Caso Lume, Caso Ipiranga, Caso Aurea, Caso Lutfalla (família de Paulo Maluf, marido de Sylvia Lutfalla Maluf), Caso Abdalla, Caso Atalla, Caso Delfin (Ronald Levinsohn), Caso TAA. Cada caso é um capítulo do livro; Em 1983 o Prêmio Esso de Jornalismo contemplou as reportagens sobre o caso Delfin (BNH favorece a Delfin), do jornalista José Carlos de Assis, na categoria Reportagem, e sobre a Agropecuária Capemi (O Escândalo da Capemi), do jornalista Ayrton Baffa, na categoria Informação Econômica. Autor de “A Era da Certeza”, que acaba de ser lançado pela Amazon. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


PATROCÍNIO


Tribuna recomenda!