Redação

Desta vez na condição de ex-chanceler, Ernesto Araújo retornou ao Senado para prestar esclarecimentos sobre as ações do Itamaraty durante a pandemia. Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, o ex-ministro negou atritos com a China e foi acusado pelos parlamentares de mentir à comissão. O depoimento ocorreu nesta terça-feira (18), quando ele também confirmou ter mobilizado o ministério de Relações Exteriores para compra de hidroxicloroquina por orientação do presidente Jair Bolsonaro.

“Jamais promovi nenhum atrito com a China, seja antes, seja durante a pandemia”, disse Ernesto Araújo em uma das ocasiões. Ele manteve a fala mesmo quando confrontado com a apresentação, por parte dos senadores, de declarações dadas por ele contra o governo chinês. Os parlamentares também resgataram um artigo no qual o ex-chanceler chama de “comunavírus” o vírus da Covid-19.

As recorrentes negativas perante os fatos irritaram os membros da CPI. “Vossa Excelência está faltando com a verdade e nega aquilo que escreveu”, reagiu o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM).

Ainda durante o depoimento, Ernesto Araújo jogou a responsabilidade sobre as demais ações à frente do Itamaraty no que diz respeito ao combate à pandemia para o Ministério da Saúde. Por mais de uma vez disse que agiu sob coordenação da pasta. Nesta quarta-feira (19) é aguardado o depoimento do ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazzuello.

A última vez que Ernesto Araújo esteve no Congresso foi em março deste ano, quando a pauta “ideológica anti-China” também dominou os questionamentos. Na ocasião, os parlamentares pressionaram pela saída do chanceler alegando que os rumos da política exterior brasileira sob a batuta dele estaria gerando desgastes com o principal fornecedor de insumos para fabricação de vacina contra a Covid no Brasil. Ernesto pediu demissão do cargo no fim daquele mês.

Relações com a China

O ex-chanceler negou que tenha provocado atritos com a China. Porém, o presidente da Comissão, Omar Aziz (PSD-AM), lembrou o artigo “Chegou o Comunavírus” escrito e divulgado por Ernesto Araújo ainda no cargo. Veja as declarações do ex-ministro:

Contestado, o ex-ministro disse que o artigo “não é ofensivo” a China. Ele também negou as discussões que teve com o embaixador da China no twitter. Ernesto Araújo foi repreendido pelo senador Omar Aziz por começar mentindo na CPI.

Cloroquina

Ernesto Araújo disse que a solicitação para a compra de cloroquina da Índia partiu do Ministério da Saúde e que desconhece  base técnica para isso. Veja:

Organização Mundial da Saúde

O ex-chanceler confirma que partiu dele a ordem para não endossar as recomendações da Organização. Ernesto alegou que a OMS tinha “idas e vindas” em suas decisões.

“Sua memória não é boa”

Escolhida pela bancada feminina para falar hoje, Kátia Abreu (PP-TO) expõe inconsistências de Ernesto Araújo entre o que ele disse na CPI.  Para ela, o ex-ministro inflama em twitter e artigos. A senadora Katia Abreu é presidente da Comissão de Relações Exteriores no Senado. A parlamentar e o ex-chanceler já tiveram atritos.

“O senhor deve desculpas ao Brasil. Em vez de pária nos colocou no papel de irrelevante. […] O senhor é um negacionista compulsivo. O senhor no Ministério das Relações Exteriores (MRE) foi uma bússola que nos direcionou para o caos, para um iceberg, para o naufrágio. Bússola que nos levou pro naufrágio da política internacional”

A senadora pediu quebra de sigilo à CPI da Covid de correspondências do Palácio do Itamaraty com outros ministérios e também com a Presidência da República.

Eduardo Bolsonaro

O ex-ministro das Relações Exteriores defendeu as atitudes antidiplomáticas do filho do presidente da República, deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Eduardo também foi presidente da Comissão de Relações Exteriores na Câmara e chegou a dizer que a culpa da epidemia da covid-19 era da China.  Para Ernesto, o ato mais grave foi do embaixador da China ao retuitar uma publicação que chamava a família Bolsonaro de “veneno do Brasil”.

“O Embaixador da China fez um retuíte de um tuíte que dizia, abre aspas, “a família Bolsonaro é o veneno do Brasil”, fecha aspas. Isso foi extremamente ofensivo. Isso obviamente é totalmente fora das atribuições de um diplomata, de acordo com a prática diplomática, com a Convenção de Viena. E eu procurei chamar atenção para isso, nessa ocasião, em março. Então, dissemos que é inaceitável o Embaixador ofender o Presidente da República”, disse.

Otto Alencar x Eduardo Girão

O senador Otto Alencar (PSD-BA) rebateu a fala do senador Eduardo Girão (Podemos-CE ) sobre a posição do Brasil no ranking da vacinação. De acordo com Girão, o Brasil é o  4º país que mais vacinou. Os números estão equivocados, o país vacinou apenas 9,8% da população brasileira com as duas doses dos imunizantes segundo o ministério da Saúde. Os dois senadores discutiram sobre a veracidade dos números. O desentendimento culminou em um intervalo da Sessão.

Missão à Israel 

A presença do assessor especial do presidente Jair Bolsonaro, Max Moura, na comitiva brasileira que viajou à Israel durante a pandemia foi questionada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). “Qual o papel técnico e científico dele?”, indagou o parlamentar.

Esta missão custou cerca de R$ 500 mil aos cofres públicos e teve como pretexto conhecer um spray nasal que, conforme alegado à época da viagem, seria capaz de curar a Covid-19. Posteriormente questionado pelo PSOL, o Itamraty afirmou que os dois países não firmaram acordo para continuidade dos estudos sobre o spray.

Bolsonaro

Ainda na tentativa de se eximir de omissões do Itamaraty durante a pandemia, ex-chanceler disse que não foi demandado pelo presidente da República para atuar na compra de vacinas. “Nunca fui demandado pelo Presidente da República sobre as vacinas, a não ser no caso da Índia”, declarou.

Desde o início da sessão, Ernesto Araújo tem adotado como estratégia repassar ao Ministério da Saúde a responsabilidade sobre as negociações de imunizantes. “O Itamaraty atuava a partir do que era requerido pelo Ministério da Saúde, como no caso da negociação com a Covax”, acrescentou.

Em outro momento, afirmou: “O ministério das relações exteriores sempre atuou por coordenação do Ministério da Saúde”.

Oxigênio da Venezuela

O ex-chanceler também terceirizou a responsabilidade sobre a falta de oxigênio no Amazonas.

Ele confirmou ter sido procurado pelo governo amazonense para viabilizar um avião capaz de transportar o oxigênio doado pela Venezuela ao estado durante a crise de falta de insumos.

Na ocasião, diversas pessoas infectadas com a Covid chegaram a morrer nos hospitais do Amazonas por asfixia. Entretanto, conforme Ernesto, o governo do estado não informou as especificações sobre o tipo de cilindro que seriam transportados e por isso não houve apoio com aviões.

Durante o questionamento, feito pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), o líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) pôs em dúvida se os oxigênios tinham sido doados realmente pela Venezuela ou corresponderiam a repasses de um estoque da empresa White Martins. Em resposta, a embaixada da Venezuela enviou aos congressistas, poucos minutos depois, a fatura do oxigênio doado pelo país aos brasileiros.

Novos requerimentos  

Os membros da CPI também devem votar nesta terça requerimentos de convocação de autoridades como o coronel Antônio Elcio Franco Filho, ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, e o presidente do Plenário da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), Hélio Angotti Neto. Deve ser analisado, ainda, pedido de quebra de sigilo de empresas ligadas ao ex-secretário de Comunicação do governo Fabio Wajngarten, que foi ouvido pela CPI na  semana passada. Os senadores vão ouvir amanhã o depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, considerado o mais aguardado até o momento.

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Fonte: Congresso em Foco