Redação –
Após ter sido um dos principais personagens da “farra das passagens aéreas“, que foi revelada pelo Congresso em Foco e levou a Câmara a mudar as regras de uso da cota parlamentar para a compra de passagens em 2009, o deputado Fábio Faria (PSD-RN) volta a apresentar gastos de transporte no mínimo curiosos. Desde o início da atual legislatura, ele utilizou a cota parlamentar para ir a São Paulo 43 vezes e apenas seis vezes para se deslocar até o estado pelo qual foi eleito.
Levantamento realizado pelo Congresso em Foco em parceria com o Instituto OPS revela que só neste ano Fábio Faria destinou mais de R$ 72 mil da cota parlamentar para viagens a São Paulo, onde mora com a esposa e apresentadora Patrícia Abravanel, que é filha do apresentador Silvio Santos, e os três filhos pequenos. De acordo com os gastos com passagens aéreas registrados pela Câmara dos Deputados, foram ao todo 43 voos entre Brasília e São Paulo, além de mais duas viagens para Belo Horizonte e uma para o Rio de Janeiro, que somam mais R$ 3,3 mil.
Já para o Rio Grande do Norte, onde foi eleito com mais de 70 mil votos para o quarto mandato como deputado federal no ano passado, o deputado viajou apenas seis vezes neste ano – quatro vezes direto de Brasília e duas vezes a partir de São Paulo. O gasto com viagens ao estado que elegeu Fábio Faria foi pouco maior que R$ 15 mil. Isto é, somente 20% de todo o recurso investido nas viagens para a residência da família, em São Paulo.
Ao todo, o gasto de Fábio Faria com passagens aéreas soma R$ 92 mil neste ano. É cerca de 1/4 de todas as despesas já declaradas pelo deputado: R$ 339 mil.
Tiririca
A situação de Fábio Fabia é semelhante à que levou o Ministério Público Federal (MPF) a instaurar um inquérito civil contra Tiririca (PL-SP). Eleito deputado federal por São Paulo, Tiririca é investigado por ter usado a maior parte da sua cota parlamentar com viagens para Fortaleza. Como revelou o Congresso em Foco, o deputado destinou R$ 70 mil da cota a passagens aéreas entre Brasília e Fortaleza. Ele chegou a admitir que estava usando o dinheiro público para visitar a família e não para manter contato com a base que o elegeu deputado.
Regras
De acordo com o regimento interno da Câmara dos Deputados, a cota de passagens aéreas só deve ser utilizada para atividades relacionadas ao mandato e para o deslocamento do parlamentar para sua base eleitoral. Fica vedado, portanto, o uso para fins particulares.
Procurado, o deputado Fábio Faria garante, por sua vez, que a cota permite o custeio do deslocamento entre o trabalho e a residência do parlamentar. Ele diz então que, como tem residência em Natal e também em São Paulo, não tem problema em usar o dinheiro público para ir à capital paulista.
> Congresso ameaça liberar farra das passagens dos partidos
“De acordo com a Diretoria Geral da Casa, os deslocamentos do parlamentar entre seu domicílio e a Câmara dos Deputados cumprem integralmente com as normas pertinentes. É de conhecimento público que Fábio Faria tem residência em Natal e em São Paulo, onde vivem sua esposa e os três filhos pequenos”, informou a assessoria do deputado, que também pediu para a Câmara se posicionar sobre o assunto, já que Fábio Faria é o atual terceiro secretário da Mesa.
A assessoria de imprensa da Câmara informou que o Ato da Mesa 43 “não estabelece vedação ao uso da cota em viagens nacionais, independentemente do destino escolhido pelo parlamentar ou do estado pelo qual ele foi eleito – tendo em vista que o mandato tem caráter nacional”. “Ademais, é normal que o parlamentar possa retornar ao local escolhido para seu domicílio familiar ainda que este seja diferente daquele pelo qual foi eleito”, acrescentou.
O ato citado pela Câmara, porém, diz logo em seu primeiro artigo que a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar – CEAP deve ser “destinada a custear gastos exclusivamente vinculados ao exercício da atividade parlamentar”. E o próprio Fábio Faria admite que o que lhe leva a São Paulo não é o exercício da atividade parlamentar, mas a sua família.
Relação com a base
O deputado garante que “esse fato não interfere na sua atuação política, já que mantém contato frequente com prefeitos e lideranças e está presente no Estado em compromissos pontuais”. Ele ainda diz que usa bastante as redes sociais para manter-se em contato com seu eleitorado.
Nas suas páginas oficiais na internet, de fato há poucas fotos das viagens a São Paulo com a família. Uma das poucas exceções é a foto que ilustra esta matéria, que foi postada em homenagem a Silvio Santos, no dia do aniversário do apresentador. Encontros com os representantes políticos do Rio Grande do Norte, por sua vez, estão registrados na internet.
“Todas as semanas, o deputado Fábio Faria está presente em Brasília e o seu trabalho é em benefício do Rio Grande do Norte, focado em levar recursos e ações para os municípios e para o Estado. Nos últimos dois anos, foi o parlamentar que mais conseguiu recursos para o RN. Somente em 2019, destinou R$ 49,3 milhões em emendas para mais de 50 municípios e presta contas, diariamente, através da mídia e das redes sociais, onde tem forte interação com a população”, alega a assessoria do deputado.
Perfil
Fábio Faria é filho do ex-governador do Rio Grande do Norte, Robinson Faria (PSD). Ele foi eleito para o primeiro mandato na Câmara dos Deputados com menos de 30 anos e uma das maiores votações do estado. Hoje, está na quarta legislatura, é o terceiro secretário da Mesa da Câmara e atua sobretudo na defesa da saúde e da juventude.
O deputado também está à frente de uma das concessões de rádio e TV do Rio Grande do Norte e já foi investigado pela Lava Jato por conta de repasses suspeitos da J&F – inquérito que foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal, por recomendação da Procuradoria-Geral da República, no ano passado
Em 2009, o Congresso em Foco revelou que Fábio Faria usou dinheiro da Câmara para bancar viagens da apresentadora Adriana Galisteu, que na época era sua namorada, e sua mãe. Também usou a cota de passagens aéreas para transportar artistas até Natal para que eles prestigiassem o seu camarote no Carnaval.
Após a reportagem, ele reembolsou a Câmara. O caso fez parte da série conhecida como farra das passagens, que mostrou como quase todos os parlamentares utilizavam a verba do Congresso para viagens particulares e voos de familiares, amigos e cabos eleitorais. A série rendeu o Prêmio Esso e o Embratel/Tim Lopes ao Congresso em Foco. Depois disso, a Câmara mudou as regras para impedir que a cota fosse usada para viagens particulares ou de terceiros que não tenham relação com o exercício do mandato.
Fonte: Congresso em Foco, por Marina Barbosa e Lúcio Big
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