Redação

E-mails revelados em reportagem do Jornal Nacional neste sábado (3.jul.2021) mostram que o diretor de Imunização do Ministério da Saúde, Laurício Monteiro Cruz, deu aval para que o reverendo Amilton Gomes de Paula e a Senah (Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários) negociassem a compra de 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca por US$ 17,50 a dose com a empresa americana Davati Medical Supply.

Segundo o Jornal Nacional, os e-mails foram confirmados pelo representante comercial da Davati no Brasil, Cristiano Carvalho, que estava copiado nas mensagens. De acordo com a reportagem, os seguintes personagens estavam envolvidos no intermédio de contrato com a empresa e o governo brasileiro:

  • Laurício Monteiro Cruz — diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde;
  • Reverendo Amilton Gomes de Paula — presidente e fundador da Senah (Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários);
  • Élcio Franco — ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, exonerado em 26 de março. Segundo o Jornal Nacional, Élcio teria participado de reunião com o representante da Davati, Cristiano Carvalho, do dia 12 de março;
  • Cristiano Carvalho — representante comercial da Davati no Brasil;
  • Hélcio Bruno de Almeida — coronel do Exército que teria participado de reunião sobre a negociação de vacinas  com Élcio Franco e Cristiano Carvalho.

O valor de  US$ 17,50 por dose indicados pelo reverendo no e-mail à Davati representa 3 vezes mais do que os US$ 5,25 que o Ministério da Saúde pagou em cada dose da vacina AstraZeneca comprada em janeiro, de um laboratório na Índia.

A quantia é bem maior do que os US$ 3,50 mencionados pelo cabo da Polícia Militar  Luiz Paulo Dominghetti em depoimento à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid. Dominghetti se apresentou como vendedor autônomo de vacinas da Davati e intermediário entre a empresa e o Ministério da Saúde na mesma negociação de 400 milhões de doses.

A negociação não foi concretizada. A AstraZeneca afirmou que não negocia a venda de vacinas por meio de empresas ou representantes comerciais, e vende diretamente à governos e o consórcio Covax.

E-MAILS

De acordo com o Jornal Nacional, no dia 23 de fevereiro, Laurício Monteiro Cruz, diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, enviou um e-mail para o reverendo Amilton, presidente da Senah. O assunto: “lista de presença e carta de proposta de fornecimento”.

“Inicialmente agradecemos a disponibilidade da Senah, representada por sua pessoa (…). Na apresentação da proposta comercial para fornecimento de 400 milhões de doses da vacina Astrazeneca”. E finaliza dizendo que “todos os processos de aquisição de vacinas no âmbito do Ministério da Saúde estão sendo direcionados pela Secretaria Executiva.”, diz trecho do e-mail.

A reportagem diz que dia 4 de março, o reverendo postou fotos de uma reunião no Ministério da Saúde. Laurício Monteiro Cruz, o diretor de imunização do ministério, está em uma delas. Na postagem, o reverendo escreveu: “Senah faz reunião no ministério para articulação mundial em busca de vacinas e para a consecução de uma grande quantidade dos imunizantes a ser disponibilizada no Brasil”.

Em 9 de março, Laurício Cruz envia outro e-mail, desta vez endereçado a Herman Cardenas, presidente da Davati nos Estados Unidos: “Informo que o Instituto Nacional de Assuntos Humanitários representados pelo seu presidente Amilton Gomes, esteve no Ministério da Saúde em agenda oficial da Secretaria de Vigilância em Saúde e no Departamento de Logística com a discussão sobre as tratativas sobre a vacina da ‘Astrazenica’ (sic) e que o mesmo foi encaminhado para a Secretaria Executiva do Ministério da Saúde”.

Em outro trecho, o diretor de imunização deixa claro que a Senah tinha o aval do Ministério da Saúde para negociar a compra de vacinas com a Davati: “Por fim, esperamos que os avanços de forma humanitária entre o ministério e ‘Astrazenica’ pelo Instituto Nacional de Assuntos Humanitários”. O instituto a que ele se refere é a Senah, a entidade presidida pelo reverendo Amilton.

No dia seguinte, 10 de março, o reverendo Amilton enviou um e-mail para o presidente da Davati nos Estados Unidos. Em inglês, o reverendo escreve: “Eu cordialmente venho agradecer pela confiança depositada em nossa instituição em conduzir negociações com o Ministério da Saúde do Brasil. As negociações estão em estágio final e a expectativa é que o contrato seja assinado em 12 de março de 2021”.

O reverendo diz ainda: “Nós pedimos para que enviem os dados para preencher o contrato de aquisição das vacinas (…) e que seja fornecido o SGS para ser enviado ao ministro quando ele requisitar”. SGS é nome de uma empresa de certificação que atesta se determinado produto está em conformidade com as normas e regulamentações.

Por fim, o reverendo faz um pedido: “Nós solicitamos com urgência o FCO atualizado, com o valor de US$17,50 como acordado em 5 de março e com a data de entrega”. FCO é uma sigla em inglês que quer dizer oferta completa de venda. US$ 17,50, o valor que seria pago por dose.

O reverendo manda um novo e-mail um dia depois. E reafirma para o presidente da Davati: “A Senah, devidamente reconhecida como interlocutora na negociação referente à aquisição das vacinas Astrazeneca entre a companhia Davati e o Ministério da Saúde, vem através deste informar que em 12 de março, às dez da manhã no horário do Brasil, haverá um encontro com o secretário executivo do Ministério da Saúde, coronel Élcio Franco, para tratar de questões relacionadas à aquisição de vacinas da Astrazeneca via Davati, fortalecendo assim a confiabilidade dos laços para futuras aquisições”.

O reverendo diz que a presença dos representantes da Davati na reunião será extremamente importante para validar a proposta de preço.

O jornal disse que representante da Davati no Brasil, Cristiano Carvalho confirmou por telefone que o encontro com Élcio Franco ocorreu dia 12 de março às 10h05. Na agenda oficial de Élcio Franco, nessa data, aparece uma reunião com o presidente do Instituto Força Brasil, coronel Hélcio Bruno de Almeida. O representante da Davati diz que o coronel também participou da reunião sobre a vacina.


Fonte: Poder360