Redação

O delegado Felipe Alcantara de Barros Leal, chefe do Serviço de Inquéritos da Polícia Federal, afirmou que não é possível “presumir” a autenticidade e a integridade das mensagens entre procuradores da “lava jato” obtidas pelos hackers a apreendidas pela PF. Porém, o Serviço de Perícias em Informática do Instituto Nacional de Criminalística da instituição atestou a veracidade e integridade do material que revelou o conchavo entre procuradores e o ex-juiz Sergio Moro.

Em documento, Leal disse que a perícia da PF não confirmou a autenticidade das conversas, segundo informou o jornal O Globo. Dessa maneira, destacou o delegado, os diálogos são provas ilícitas e seria abuso de autoridade usar o material em ações, como o inquérito aberto no Superior Tribunal de Justiça para investigar ameaças de procuradores a ministros da corte.

De acordo com Leal, a invasão demonstra que o hacker não teve dolo apenas de obter os dados, mas também de adulterá-los. Assim, não é possível presumir a autenticidade do material. Segundo o delegado, permitir o uso dessa prova ilícita contra as próprias vítimas seria a “eutanásia dos rumos da Polícia Judiciária, atingindo por ricochete, em visão holográfica, todos os princípios que inspiram a atuação policial”.

Nessa mesma linha, o subprocurador da República José Adonis Callou de Araújo, responsável pela investigação aberta pelo STJ, disse que, “com base no material apreendido, é tecnicamente impossível atestar a integridade”. Ele destacou que isso só seria possível acessando os bancos de dados do Telegram ou dos próprios procuradores.

Autenticidade das mensagens
Em 2020, o Serviço de Perícias em Informática do Instituto Nacional de Criminalística da PF confirmou a autenticidade e integridade das mensagens de procuradores e Moro. Pelo menos três decisões judiciais do ano passado citaram a perícia.

Uma delas foi a decisão de 28 de dezembro do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, determinando que a 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal compartilhasse com a defesa do ex-presidente Lula parte das mensagens trocadas entre procuradores. As conversas foram apreendidas no curso da chamada operação “spoofing”, que investiga a invasão dos celulares de Moro, de procuradores e de outras autoridades da República.

Na decisão, Lewandowski citou relatório da Polícia Federal que mostra que os dados apreendidos na “spoofing” foram devidamente periciados e tiveram sua autenticidade comprovada.

“Todos os dispositivos arrecadados foram submetidos a exames pelo Serviço de Perícias em Informática do Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal, que objetivaram a extração e análise do conteúdo do material, com a elaboração de Laudo Pericial de Informática Específico para cada item apreendido”, diz o relatório.

“Dessa forma”, prossegue o documento mencionado por Lewandowski, “qualquer alteração do conteúdo em anexo aos Laudos (remoção, acréscimo, alteração de arquivos ou parte de arquivos), bem como sua substituição por outro com teor diferente, pode ser detectada”.

Se em discursos públicos alguns integrantes do MPF no Paraná afirmaram de forma ensaiada que não reconhecem a veracidade das conversas reveladas pela “vaza jato”, em autos sigilosos a versão apresentada é outra.

O procurador Diogo Castor de Mattos, ex-integrante da autointitulada força-tarefa da “lava jato”, solicitou, em meados de junho deste ano, acesso a uma parte das conversas que lhe faziam referência. O pedido foi atendido, ainda que Castor não conste entre os investigados na “spoofing”, ao que se sabe.

Em 5 de junho de 2020, Ricardo Augusto Soares Leite, juiz substituto da 10ª Vara Federal Criminal do DF, deu ao procurador acesso a um laudo pericial comprovando que ele teve o celular invadido.

“Defiro. A autoridade policial deverá disponibilizar à defesa de Diogo Castor de Mattos o acesso ao laudo pericial que comprova a invasão do celular do procurador Diogo Castor de Mattos e uma mensagem específica trocada entre o procurador da República José Robalinho e o hacker (que estava usando o celular do conselheiro do CNMP Marcelo Weitzel).”

Por fim, em 10 de julho, decisão também do juiz Ricardo Augusto Soares Leite deu a uma série de réus acesso ao material aprendido na “spoofing”. Na ocasião também foi dito que os documentos passaram por perícia.

“Defiro o acesso das defesas aos arquivos obtidos em razão da operação spoofing e já periciados e que se encontram com a autoridade policial, ficando a cargo de cada advogado de defesa e à Defensoria Pública da União entregar um HC externo ao delegado de Polícia Federal, Dr. Zampronha, que providenciará a disponibilização do material e transferência de 7 TB de arquivos, certificando a entrega do material às partes que estarão cientes do tempo necessário para baixar essa elevada quantidade de dados, bem como a necessidade de se resguardar o sigilo de tais dados por conterem informações privadas de pessoas físicas”, diz a decisão.

O pedido foi feito pelos réus Danilo Cristiano Marques, Suelen Priscila de Oliveira, Gustavo Henrique Elias Santos, Thiago Eliezer Martins Santos, Walter Delgatti Neto e Luiz Henrique Molição, acusados de ter invadido os celulares de Moro e dos procuradores.

Os autos do inquérito da “spoofing”, que tramitam na 10ª Vara Federal Criminal do DF, estão sob sigilo. O pedido feito pelos réus foi encontrado em um HC público. O mesmo ocorreu com o pedido formulado por Castor.

Compartilhamento de mensagens
O ministro do STF Ricardo Lewandowski determinou nesta segunda-feira (12/4) que as últimas conversas entre procuradores de Curitiba enviadas à corte pela defesa do ex-presidente Lula sejam compartilhadas com o Superior Tribunal de Justiça.

Deferindo pedido do presidente do STJ, ministro Humberto Martins, uma decisão de 4 de março já havia autorizado o envio das mensagens ao tribunal superior. De lá para cá, no entanto, os advogados de Lula mandaram ao Supremo uma série de novos diálogos.

“Tendo em conta ainda que, não apenas o presidente [do STJ], como também os demais ministros têm legítimo interesse em conhecer o conteúdo das referidas mensagens, em especial aquele que lhes diga respeito diretamente, defiro o pedido”, afirmou Lewandowski.

Ao falar em “interesse” por parte do STJ, a decisão faz referência a diálogos que mostraram que a “lava jato” de Curitiba investigou ilegalmente ministros da corte.

Por causa disso, Humberto Martins abriu um inquérito contra os procuradores paranaenses. O procedimento acabou suspenso pela ministra Rosa Weber, do STF.


Fonte: ConJur