Por Iata Anderson –
Surpreendente ação nas bolsas, talvez a mais fantástica, foi a compra do Cruzeiro pelo ex-atacante Ronaldo Nazário, que um dia foi fenômeno, pelo futebol espetacular que encantou o mundo no início da década de 1990, principalmente na Internazionale, da Itália, quando ganhou o apelido. O que pouquíssimas pessoas sabem é que fui o último treinador de Ronaldo, enquanto amador. Convidado por Alfredo Sampaio que havia sido chamado para substituir o técnico Madeira, ex-jogador, no time profissional, fui convidado (Havia voltado do Hilal, da Arábia Saudita) pelo amigo para dirigir o time Junior do São Cristóvão, que ele havia montado para “ganhar o segundo turno” com a volta de um atacante que estava com a seleção brasileira disputando o torneio Sul-Americano sub 17, na Colômbia, onde terminou artilheiro e melhor jogador.
Na verdade, foi o único destaque do time, que acabou fora do Mundial Sub-17, em 1993. “Quando ele voltar você ganha fácil o segundo turno e vai à final” disse Alfredo, conhecedor do potencial daquela joia que o São Cristóvão já tratava com muito carinho. Peguei o time, sem os dois zagueiros que Sampaio levou para os profissionais e fui montando o time com o que tinha. Um dia, sábado à tarde, treino para o jogo com a Portuguesa, lá estava ele, o tal “menino”, sentado na grama. Eu não conhecia, perguntei quem era. “Ronaldo”, respondeu tímida e educadamente. “Vai treinar”, perguntei? Resposta afirmativa dei-lhe o colete branco, para conhecer o tão badalado “menino”.
O que vimos, Roberto Prata (preparador físico) e eu, nunca mais saiu das nossas mentes.
Um avião em campo, espantoso, um show, vinte anos à frente do seu tempo. Voltou no sábado seguinte, treinou para manter a forma e sumiu. Já estava sendo vendido. Perdi o segundo turno mas o mundo ganhou um dos maiores jogadores de todos os tempos. Um fenômeno. Duas semanas depois, vendo um jogo do Cruzeiro, na TV, lá estava o “menino”. Voando, 20 anos à frente do seu tempo.
Em março de 1994, contra a Argentina, lá estava ele com a camisa amarela, agora no time principal. O resto vocês conhecem.
Soa estranho, mesmo para um rubro-negro, nostálgico confesso. Como assim, venderam o futebol que foi o melhor do Brasil, por décadas, dividindo com o Santos de Pelé a hegemonia do futebol brasileiro e sul americano? Como venderam o time que foi metade da seleção brasileira bicampeã mundial no Chile, em 1962, com Garrincha, o melhor jogador do torneio jogando por ele e por Pelé, machucado no segundo jogo e substituído por outro botafoguense, Amarildo, que salvou o time contra a Espanha e fez gol na final contra os tchecos? Como venderam o futebol que goleou a Argentina, no Maracanã, com a camisa da seleção brasileira, um dos maiores “olés” da história do então maior estádio do mundo. Venderam o futebol que fazia um rubro-negro pegar o bonde 21 – Circular – no Leblon, descer em frente à Igreja de Santa Teresinha, depois do túnel novo, andar até General Severiano para ver os coletivos de sexta-feira, o “apronto”, arquibancadas lotadas, gramado cheio de “cobras” como dizia João Saldanha? É verdade que esse rubro-negro virou atleta alvinegro, com Adjalme de Carvalho, Rodney, e outros, comandados pelos professores Genaro e Anunciato, uma rápida mas alegre experiência nas pistas.
Como venderam o Botafogo de Garrincha, Nilton Santos, Jairzinho, Paulo Cesar Lima, Gerson, Heleno de Freitas, Marinho Chagas, Rogerio, Roberto Miranda, Manga, Sebastião Leônidas, Amarildo, Zagallo, Quarentinha, Paulo Valentim, Didi, Carlos Roberto, Afonsinho, Ney Conceição e tantos mais ? Soa estranho, é verdade, mas é assim que a banda toca nos dias de hoje. Não sei onde isso vai parar. Grandes clubes europeus foram vendidos e vivem com as contas em dia, gastando centenas de milhões de euros, contratos absurdos, times maravilhosos.
Uma nova tendência, sabemos, mas até quando o petróleo vai comandar a economia mundial?
IATA ANDERSON – Jornalista profissional, titular da coluna “Tribuna dos Esportes”. Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como as Organizações Globo, TV Manchete e Tupi; Atuou em três Copas do Mundo, um Mundial de Clubes, duas Olimpíadas e todos os Campeonatos Brasileiros, desde 1971.
Tribuna recomenda!
NOTA DO EDITOR: Quem conhece o professor Ricardo Cravo Albin, autor do recém lançado “Pandemia e Pandemônio” sabe bem que desde o ano passado ele vêm escrevendo dezenas de textos, todos publicados aqui na coluna, alertando para os riscos da desobediência civil e do insultuoso desprezo de multidões de pessoas a contrariar normas de higiene sanitária apregoadas com veemência por tantas autoridades responsáveis. Sabe também da máxima que apregoa: “entre a economia e uma vida, jamais deveria haver dúvida: a vida, sempre e sempre o ser humano, feito à imagem de Deus” (Daniel Mazola). Crédito: Iluska Lopes/Tribuna da Imprensa Livre.
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