Por Siro Darlan e Silvana do Monte Moreira –

Série Especial: ADOÇÕES – Parte VII.

Adoção no Brasil é o ato jurídico solene pelo qual alguém estabelece um vínculo de filiação. Isto ocorre independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo entre adotante e adotado.

Nesse sentido, os laços criados com a adoção são considerados análogos aos que resultam de filiação biológica, de modo que, a adoção atribui a condição de filho legítimo ao adotando, atribuindo-lhe os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios.

A decisão de adotar um filho deve ser planejada e tomada com muita responsabilidade. A adoção é um ato irrevogável, ou seja, não admite arrependimento posterior.

Ao tomar a decisão de adotar, o adotando cria um laço de parentesco de 1º grau em linha reta, que se estende por toda a família do adotante. Na adoção a criança ou adolescente adotando se torna filho(a) de uma pessoa ou de um casal,  e passa a ter desde então os mesmos direitos de um filho biológico.

Aqui abro um curto parêntese explicativo:

Adotando  = quem está sendo adotado;

Adotante  = quem quer adotar;

Uma vez que a adoção se concretize, a criança/adolescente adotado se desliga de qualquer vínculo com pais e parentes biológicos,  salvo os impedimentos matrimoniais.

Por isso, a adoção é considerada ato jurídico legal que estabelece vínculo de filiação independente da procriação.

QUEM PODE ADOTAR UMA CRIANÇA OU ADOLESCENTE NO BRASIL?

Embora seja um ato que se fundamente na afetividade, no amor em si, nem todas as pessoas podem realizar a adoção.

Alguns requisitos mínimos devem antes ser preenchidos. Por exemplo, para ser um candidato hábil para adoção, é necessário que o adotante tenha alcançado a maioridade, ou seja, ter 18 anos completos. Da mesma forma, é necessário que o adotante seja ao menos 16 anos mais velho que aquele que será adotado.

Somente pessoas casadas que podem adotar?

O estado civil do adotante é irrelevante, de modo que o adotante pode ser pessoa casada, viúva, solteira ou em união estável. Outro ponto que merece destaque é que a adoção no Brasil pode ser realizada por casais homoafetivos, desde que observados os requisitos da idade, comum a todo adotante.

Pessoas  Divorciadas  ou separadas de fato também podem adotar conjuntamente, desde que a convivência com a criança tenha se iniciado durante a União Conjugal.

PRÉ REQUISITOS PARA ADOTAR NO BRASIL

  • ter idade mínima de 18 anos;
  • diferença mínima de 16 anos entre o adotante e o adotado;
  • apresentar carteira de identidade, comprovante de residência atualizada e em seu nome, CPF, certidão de nascimento ou casamento, comprovante de renda, certidão de antecedente criminais e atestado médico de sanidade mental;
  • realizar requerimento de inscrição de adoção para construção de dossiê. A petição é para habilitar o pretendente em um cadastro preliminar;
  • participar de  curso de preparação psicossocial e jurídica  que dura cerca de 2 meses e tem aulas semanais;
  • submissão à avaliação domiciliar feita por uma equipe técnica, com entrevistas com psicóloga e assistente social, sendo emitido um laudo.

QUANTO TEMPO DEMORA UM PROCESSO DE ADOÇÃO NO BRASIL

Conforme já foi mencionado, o procedimento para adoção no Brasil é criterioso e burocrático, razão pela qual, pode ser demorado. É difícil precisar a duração de um processo de adoção, sobretudo porque, sua celeridade está vinculada a diferentes fatores, como a disponibilidade de adotando que contenha o exato perfil solicitado pelo adotante.

A princípio,  o candidato a adotante deve se dirigir a uma Vara de Infância e Juventude de seu município para manifestar seu interesse. Neste momento adotante deverá  preencher os pré requisitos  elencados acima, bem como, apresentar a  documentação correspondente.

Ademais, o procedimento incluirá a realização de visitas de assistentes sociais, que tem o objetivo de conhecer o ambiente em que a criança será inserida. A avaliação dos assistentes visa detectar se determinado ambiente é saudável o suficiente para receber uma criança ou adolescente.

O resultado da avaliação assistencial será encaminhado ao Ministério Público e ao juiz da Vara de Infância e juventude, e integrará os autos do processo. A partir do laudo da equipe técnica da Vara e do parecer emitido pelo Ministério Público, o juiz dará sua sentença concedendo a adoção ou não.

Nas hipóteses de acolhimento do pedido do pretendente/adotante, o nome dele será inserido no CNA, com validade por dois anos no território nacional. Caso não seja encontrada uma criança/adolescente no perfil solicitado pelo pretendente, durante este período, o adotante terá que reiniciar o processo adotivo.

Caso seja encontrada uma criança/adolescente com o perfil indicado pelo pretendente à adotante, a própria Vara de Infância se encarregará de informar o interessado.

Neste momento, todo o histórico de vida da criança/adolescente é apresentado ao adotante e, se houver interesse, ambos são apresentados. O adotando também será entrevistado após o encontro com o adotante, poderá dizer se quer ou não continuar com o processo.

O procedimento é complexo e visa resguardar a integridade física e psíquica das crianças e adolescentes a serem adotados. Por isso, o processo de adoção pode se estender por anos.

A ação de adoção terá início com a  guarda  provisória da criança ou adolescente.

Por fim, o juiz profere a sentença de adoção e determina a lavratura do novo registro de nascimento, já com o sobrenome da nova família. Existe ainda, a possibilidade de trocar o primeiro nome da criança/adolescente adotado.

Realizados todos esses procedimentos, o filho (a) adotivo (a) passa a ter todos os direitos de um filho biológico.

Vamos agora aos depoimentos de nossos(as) adotados(as)

Meu nome é Maria Luiza e eu tenho 15 anos

Fui adotada com 11 anos, pela minha mãe, através de adoção compartilhada, tardia e monoparental.

Quando minha mãe me visitou no abrigo, eu soube que seria irmã da minha melhor amiga, Luísa Vitória, que morava comigo no mesmo abrigo. No início foi um pouco difícil, pois precisei me separar dos meus irmãos. Embora a gente conviva, é bem menos do que eu gostaria. Meus irmãos não moram longe de mim, mas os encontros não são frequentes. Minha mãe é maravilhosa! Me dá tudo, me faz feliz e me dá muito amor. Eu amo minha família! Luísa Vitória é a melhor irmã do mundo! Também tive o melhor avô do mundo, que sempre me protegeu e cuidou de mim.

Nesse ano ele se foi. Foi muito triste, mas ficamos mais unidas cuidando da vovó também. Nossa mãe cuida muito da gente e cobra muito os estudos. Ela é professora. Tenho muito orgulho dessa família. Eles são tudo na minha vida. Meus amores.

Ter sido adotada mudou a minha vida. Minha vida hoje nem se compara com o que eu passava com a família biológica.

Um abraço, Maria Luiza Kochulinski Pinheiro.

Meu nome é Kaio, tenho 11 anos e fui adotado no fim do ano passado, em 2020

Meus irmãos e eu fomos para casa de nossas mães em dezembro. Lembro daquele cheiro da casa até hoje. Cheiro bom que ficava com elas o tempo todo. No começo era um cheiro bom e gelado de gente desconhecida. Depois o cheiro sumiu e veio um cheiro de baunilha.

Mamãe Christina é minha mãe que me ajuda muito no estudo. Mamãe Tetê é super engraçada, me faz rir enquanto cuida de mim. Minhas mães contam que estavam na fila por um tempinho. Eu não sabia que elas existiam e rezava todo dia por uma família. Não sabia que elas também me procuravam. Eu tinha medo de não ser adotado, de me separar de meus irmãos. Um dia elas chegaram. Minhas mães falam que o processo foi rápido. Fiquei tão ansioso que a minha última noite no abrigo parecia que durava muito muito. Apesar da guarda definitiva ainda não ter saído, como mãe Tetê me explicou, parece que já estamos juntos para sempre.

Meus irmãos têm 6 e 2 anos, sempre cuidei deles, troquei fralda de minha irmã quando ela era bebê e eu tinha 5 anos. Agora posso ser criança e brincar com meus irmãos. Estamos juntos. Às vezes ser criança é difícil como ter que estudar todo dia ou ficar no cantinho do pensamento quando apronto alguma. Estou no 4o ano e não fiz o 3o ano por causa da Pandemia. Não podia estudar sem computador, celular, internet e não tinha essas coisas no abrigo. Lá era diferente. Enquanto falo agora e mamãe Tetê escreve, tranço o cabelo dela e é assim que é se divertir com carinho.

Um dia eu quero ser algo que ainda não sei: ser veterinário ou ser criador de desenhos?! Gosto muito de desenhar, sou bom nisso, fiz até histórias. Para mim, a adoção é mudança boa. Minha mamãe Tetê luta por mim para eu conseguir alcançar meus sonhos, minha mãe Christina me ajuda todo dia no estudo. Como tenho duas mães, o amor vem em dobro. Quem pensa diferente e dá nomes ruins para isso, está errado, muito errado. Duas mães é ter muito carinho e mais ensinamentos de mãe.

Meu nome e Maria Eduarda de Menezes Pereira, tenho 15 anos, fiz 16 no dia 09/01/22

Vivo com meu pai Jefferson Pereira, que me cria sozinho desde que minha mãe o deixou em 2017.

Meu pai me provem uma cuidadora, pois ele precisa trabalhar, apesar de já estar aposentado, para comprar minhas fraldas e também para suprir necessidades de meus irmãos.

Eu fui adotada por meu pai e minha mãe, quando tinha 3 anos. Eu morava em um abrigo, chamado Dona Meca. Havia sido abandonada por minha mãe biológica, em minha residência. Chorei por 3 dias seguidos ate que uma vizinha resolveu chamar o conselho tutelar.

Minha mãe me abandonou porque eu tenho PC, isto e, PARALISIA CEREBRAL. Minha mãe biológica me passou sífilis e me deixava amarrada nos pés da cama.

Eu estava já havia 3 anos no abrigo, quando a minha mãe adotiva, teve uma indicação da minha presença no abrigo. Detalhe, minha mãe queria adotar um bebe, pois queria uma menina. Meu pai teve um problema e já não poderia ser pai, sem que fosse feito um procedimento invasivo.

Meus pais já haviam tentado uma fertilização in vitro.

Bom, eles se apaixonaram por mim, pois sempre fui muito afetiva e sorridente.

Em 6 meses eu já era filha do casal. Ganhei um irmão, Mateus e depois veio o nascimento da Minha irmã, Gabriella.

Esses anos todos eu tenho experimentado um amor incomum das pessoas que convivem com meu pai, e o dele próprio, que por diversas vezes nestes últimos quatro anos fui suscitado para me entregar para o poder publico.

Infelizmente quanto a minha mãe não posso dizer o mesmo, mas quando a vejo em retratos quero tocar em seu rosto.
Eu não falo e não ando, me locomovo no colo do meu pai e por cadeiras de rodas. Adoro escutar musica e rio muito quando vejo novelas e filmes.

Sinto que meu pai ama muito. Que Deus o proteja e me cuide, pois sou totalmente dependente.

Sem ele não sei o que seria de mim.

Beijos no coração de todos os pais que escolhem crianças como eu.

Leia também:

Dia 11 estreia a série “Adoções”

ADOÇÕES I – Família Harrad Reis

ADOÇÕES II – Do direito à convivência familiar e comunitária

ADOÇÕES III – Obrigações de cuidado

ADOÇÕES IV – Condições para adoção

ADOÇÕES V – O processo de adoção

ADOÇÕES VI – Cadastro Nacional de Adoção

SIRO DARLAN – Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

SILVANA DO MONTE MOREIRA – Advogada, militante da Adoção Legal, mãe sem adjetivos. Presidente da Comissão de Direito da Criança e do Adolescente da OAB/RJ (2016/2018, 2019/2021), coordenadora dos Grupos de Apoio à Adoção Ana Gonzaga I e II, membro fundador da Comissão de Direito Homoafetivo da OAB-RJ, Representante para o estado do Rio de Janeiro da Associação Brasileira Criança Feliz, dentre outras atividades que desempenha. @silvanamonteadv


Tribuna recomenda!