Redação

Promover e dar visibilidade a experiências únicas, construídas em conjunto entre turistas e moradores do destino visitado. Essa é a proposta da Recria, Rede Nacional de Turismo Criativo, criada em 2017 pelos pernambucanos Karina Zapata, 44, João Paulo da Silva, 34, e Larissa Almeida, 39.

Diferentemente do turismo de massa, a Recria prioriza vivências com trocas genuínas, que estimulem o potencial criativo do turista e, ao mesmo tempo, contribuam para o desenvolvimento local e o protagonismo dos moradores nas atividades oferecidas – uma mistura dos conceitos de turismo criativo e de base comunitária.

A ideia é que ao visitar, por exemplo, a Ilha de Deus (um dos maiores manguezais urbanos do país, na zona sul recifense), o turista interaja com o ambiente, aprendendo a catar marisco ou plantando mudas no mangue que ajudem a restaurar o ecossistema. Segundo João Paulo: “É um processo inovador, de cocriação, em que o visitante cria a sua própria experiência mediada por anfitriões do local, e o resultado disso normalmente é inusitado”.

Hoje, a Ilha de Deus é um dos principais polos de turismo criativo chancelados pela Recria. Lá, há passeios de barco com pescadores para conhecer o manguezal e pescar sururu e marisco, um “ilha tour” com vivências de natureza, cultura e gastronomia, e uma oficina de mariscada, em que se aprende a catar e cozinhar mariscos com Geiseane Gomes (conhecida como Negra Linda, ela é dona do Bistrô Ilha de Deus, que em 2019 entrou na lista de endereços pernambucanos do Guia Abrasel, da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes).

HOJE A REDE CONTA COM CINCO PRODUTOS E 28 ASSOCIADOS

O pontapé inicial da empreitada foi o seminário “O Fantástico Mundo do Turismo Criativo”; organizado pelo trio em setembro de 2017, o evento apresentou a rede a profissionais do turismo, universitários, empreendedores e representantes do poder público.

João Paulo é formado em turismo e professor universitário na área de empreendedorismo. Atuou em projetos de turismo de base comunitária e frequenta a Ilha de Deus desde 2015, quando coordenou um projeto de extensão que diagnosticou o potencial turístico do lugar e resultou numa série de ações para impulsionar a economia local. Uma delas foi a inclusão da comunidade nos roteiros realizados pela Catamarã Tours por rios do Recife.

Larissa é formada em Hotelaria e também especializada em desenvolvimento territorial e turismo criativo, sendo ainda consultora credenciada do Sebrae. Karina, por sua vez, é graduada em Direito e  atuou por mais dez anos em comunidades do Recife e Natal como consultora de desenvolvimento territorial e turismo criativo, função que exerce até hoje pelo Instituto de Assessoria para o Desenvolvimento Humano (IADH), ao qual a rede está vinculada como uma célula de inovação. Segundo ela, o Brasil não incentiva esse tipo de turismo, daí a importância da Recria.

“Me angustiava ver que existiam experiências muito boas, que entregam significado humano, geram encantamento nas pessoas e contribuem para o legado social, mas que estavam difusas e desarticuladas, o que desmotivava os empreendedores pela dificuldade de acesso ao mercado”

Além da Ilha de Deus, outro destino impulsionado pela rede é a Bomba do Hemetério, bairro na zona norte do Recife, que sedia mais de 60 grupos culturais e agremiações de Carnaval da cidade. Os visitantes podem escolher entre oficinas de percussão, turbantes e adereços carnavalescos; participação em desfiles de blocos de maracatu junto aos batuqueiros, pelas ruas do bairro; e visita a restaurantes locais, como o Espetinho da Ceça, que tem pratos de bode, carne de sol e macaxeira frita.

Os passeios com bicicletas compartilhadas por Recife e Olinda, da La Ursa Tours, também têm o selo da Recria, assim como a proposta da Eletrobike – em que o artista Mozart Santos usa um triciclo com projetores, caixas de som e computadores para realizar performances multimídia. Ainda, em Triunfo, no sertão pernambucano, a empreendedora Elis Almeida usa a literatura de cordel, cantorias e poesias para apresentar lugares históricos e de aventura na cidade.

No total, nesses cinco produtos (destinos + atrativos), a rede conta com 28 associados, que oferecem atividades pré-definidas ou personalizadas, realizadas de forma avulsa ou em roteiros combinados. Os preços variam de R$ 15 (o programa Conhecendo o Território, na Bomba do Hemetério) a R$ 150, pelo tour personalizado do La Ursa Tour (cujos pacotes saem em média por R$ 80).

PARCERIAS VIABILIZAM CAPACITAÇÕES AOS EMPREENDEDORES

A Recria não tem CNPJ nem vende os passeios em si, mas dá suporte e articula oportunidades aos seus membros, que são os responsáveis pelas atrações — todas formatadas em conjunto com os gestores da rede, para que atendam critérios de qualidade dentro da proposta de turismo diferenciado.

Os associados têm oportunidade de participar de cursos como o de criação de novos produtos, design sprint, precificação e criatividade e inovação, ministrados pelos próprios gestores ou por parceiros. Quatro associados fizeram, por exemplo, uma imersão em negócios criativos em São Paulo, em evento realizado pelo Sebrae e o British Council. “Sempre tem gente nos procurando, oferecendo vagas em cursos ou com interesse em dar consultorias para os associados”, diz João Paulo.

Quase tudo é feito na base de parcerias, já que a rede não tem fonte de renda fixa e os gestores trabalham de forma voluntária. Embora eles tenham se virado bem até agora, têm percebido que isso dificulta desde o simples aluguel de um espaço para realização de um curso à inclusão de atrativos em outros estados. João Paulo explica que falta “braço” e verba para conhecer as experiências que se candidatam à rede e prestar toda a assistência aos associados, no processo de avaliação, formatação dos produtos e monitoramento. Além dos três gestores, a rede conta apenas com a ajuda da jornalista Luma Araújo no trabalho de assessoria de imprensa.  (Reprodução/fonte: Draft)